TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

176 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Eis quanto basta para afastar pertinência à convocação do princípio da legalidade em matéria criminal, pelo menos nos moldes em que o foi, para julgar a conformidade constitucional da norma impugnada. Diferentemente do pretendido pelos recorrentes, não se mostra, assim, transponível para o presente recurso a doutrina do Acórdão n.º 399/14, em que a decisão recorrida se fundara na expressa determina- ção da aplicabilidade imediata, nos autos, do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do CPP, na redação de 2013, acolhendo a perspetiva de que a redação conferida pela Lei n.º 20/2013 ao citado preceito do CPP não era inovadora – mas simplesmente interpretativa. ii) Invocação da violação do direito ao recurso e garantias do direito de defesa 11. Cumpre, finalmente, entrar na análise da questão de constitucionalidade que constitui o objeto cen- tral do presente recurso: a alegada violação do direito ao recurso e garantias do direito de defesa (artigo 32.º, n.º 1, da Constituição) pela norma segundo a qual não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdão da Relação, proferido em recurso interposto de decisão absolutória da primeira instância, que condene o arguido em pena de prisão não superior a cinco anos [artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do CPP, na redação dada pela Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro]. 12. Quanto a este aspeto, deve começar por se referir que o direito ao recurso constitui uma das mais importantes dimensões das garantias de defesa do arguido em processo penal, como tem sido invariavelmente repetido na jurisprudência do Tribunal Constitucional, mesmo antes do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição ter passado a especificar expressamente o recurso como uma das garantias de defesa a observar. A identificação expressa no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição do direito ao recurso como garantia de defesa, resultante da revisão constitucional de 1997, não tendo implicado novidade relativamente ao enten- dimento que anteriormente vinha já sendo feito pelo Tribunal Constitucional da sua redação anterior (cfr., entre outros, Acórdãos n. os 8/87, 31/87, 178/88, 259/88, 401/91, 132/92, 322/93), não deixou, contudo, de representar o reconhecimento explícito da autonomia conferida a uma tal garantia no contexto geral das garantias de defesa, isto é, um valor de garantia não amortizável pelo reconhecimento de outras garantias processuais, designadamente para defesa do arguido. Como enfatizado por Figueiredo Dias, a consagração constitucional do direito ao recurso entre as garan- tias de defesa do arguido «significa que o direito a um recurso é manifestação jurídico-constitucionalmente vinculante de um direito, liberdade e garantia pessoal da defesa. Ela não pode ser posta em causa em hipótese alguma, mesmo sob a alegação de que se verifica in concreto uma qualquer outra garantia de defesa sucedânea legalmente admissível. Sempre que, num concreto caso judicial de qualquer espécie, a lei denegue ao arguido condenado o direito a um recurso, a lei é materialmente inconstitucional e não pode, como tal, ser aplicada» (Jorge de Figueiredo Dias, “Por onde vai o Processo Penal Português”, in As Conferências do Centro de Estudos Judiciários, Almedina, 2014, p. 80). Assumindo a Constituição o direito ao recurso do arguido como integrando o núcleo essencial das suas garantias de defesa, a liberdade conformadora do legislador na definição do regime de recursos em processo penal não pode, assim, deixar de encontrar como limite aquele direito do arguido constitucionalmente garantido. Ora, o Tribunal tem entendido que o núcleo essencial daquela garantia coincide com o direito de recor- rer de decisões condenatórias e de atos judiciais que, durante o processo, tenham como efeito a privação ou a restrição da liberdade ou de outros direitos fundamentais do arguido (cfr. os Acórdãos n. os 322/93, 265/94, 610/96, 265/94, 30/01, 189/01). Certo é que a identificação das garantias de defesa do arguido, designadamente no âmbito de uma con- denação proferida em 2.ª instância, na sequência de absolvição pelo tribunal recorrido, não pode alhear-se do contexto processual em que são convocadas, o que exige, naturalmente, a compreensão de todo o regime que o delimita.

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