TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

199 acórdão n.º 413/15 Resta, assim, da jurisprudência citada, o Acórdão n.º 16/10, onde o Tribunal Constitucional se pro- nunciou sobre uma questão paralela à que constitui o objeto do recurso ora em análise. Tirado, embora, no âmbito de um processo de natureza penal, este Acórdão pronunciou-se, sobre a norma segundo a qual «o pedido de correção de uma decisão, formulado pelo arguido, não suspende o prazo para este interpor recurso dessa mesma decisão», que foi julgada inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição. Pese embora extraída de disposições legais insertas no Código de Processo Penal, concretamente os seus arti- gos 380.º e 411.º, n.º 1, o conteúdo essencial da interpretação normativa julgada neste Acórdão coincide, com efeito, com a agora em análise, sem prejuízo do diferente enquadramento jurídico-constitucional recla- mado por um âmbito de aplicação restrito a um processo de natureza laboral O Acórdão n.º 16/10, apesar de ter julgado a norma inconstitucional, não deixou, todavia, de salien- tar a diferença identificável entre um mero erro material e a verificação de obscuridade ou ambiguidade na sentença, enfatizando: «quando está em causa uma obscuridade ou ambiguidade, o arguido defronta-se com uma opacidade, maior ou menor, do conteúdo da sentença, que pode não lhe permitir alcançar, com um mínimo de certeza, o seu sentido e alcance, de modo a ter por definido o objeto da sua contra-argumentação. Já quando está em causa um erro, sobretudo quando se trata de um erro de escrita ou de cálculo, ele, em regra, não só é manifesto ou patente, como a sua retificação não levanta dificuldades de maior, sendo pos- sível por uma leitura integrada da sentença. Na maioria das vezes, o erro não é, pois, suscetível de afetar a posição do recorrente. Nomeadamente, naqueles casos em que este, independentemente do despacho que venha a recair sobre aquele pedido, dispõe, desde logo de todos os elementos indispensáveis à elaboração do seu recurso, podendo formulá-lo contando com a retificação, ou em termos de condicionalidade, de fácil conformação, sem ónus excessivos» (cfr. Acórdão n.º 16/10, n.º 10). 13. No caso da norma em apreciação estamos perante uma retificação de um mero erro de cálculo, veri- ficável por simples operação aritmética tendo por base os dados afirmados nos factos provados. O dissídio entre as partes, na parte aqui relevante, respeita à liquidação de determinadas prestações e não propriamente ao montante dessas mesmas prestações. Não está, de modo algum em causa, qualquer retificação com implicações no sentido decisório, ou sequer da sua fundamentação. Como de resto na retificação de qualquer erro exclusivamente material, não existe alteração de julgamento, antes mera a reposição da correspondência da vontade real do juiz com a vontade erroneamente declarada na sentença. Como salientado por Fernando Amâncio Ferreira, por referência a Liebman, «Erro material é o erro “na expressão”, não no pensamento; somente a leitura da sentença deve tornar evidente que o juiz, ao manifestar o seu pensamento, usou nomes, palavras ou algarismos diversos daqueles que devia ter usado para exprimir fiel e corretamente as ideias que tinha em mente. Pertence ao conceito de erro material ainda o erro de cálculo, que pode ser retificado também simplesmente, refazendo-se as operações aritméticas executadas ao formular o julgamento. Por outras palavras, o erro material é o que fica a dever-se a uma desatenção ou a um engano ocorrido na operação de redação do ato» (in Manual dos Recursos em Processo Civil, 9.ª edição, Almedina, 2009, p. 50). A eliminação de um erro de cálculo não importa qualquer modificação substancial da sentença, pelo que o seu reconhecimento e possibilidade de retificação não levantam dificuldades de maior à posição do recorrente. A sua correção não tem, com efeito, nenhuma repercussão na decisão querida pelo juiz e cla- ramente deduzível da leitura global da sua fundamentação. Da simples leitura do conteúdo da sentença é possível compreender, com certeza e segurança, todo o seu alcance, o que permite à parte prejudicada pelo decidido a plena definição do objeto da sua argumentação nas alegações de recurso. A retificação de um erro deste tipo não tem, portanto, implicação de relevo na elaboração e motivação do recurso a interpor pela parte vencida que, desta forma, pode exercer o seu direito de impugnar a decisão sem constrangimentos ou condicionamentos.

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