TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015
219 acórdão n.º 476/15 i. No caso concreto, a inconstitucionalidade destas normas é ainda mais visível por a recorrente ter adquirido os bens – que se presumem ser de proveniência ilícita – antes dos factos pelos quais foi condenada – apenas se provou o início da execução do crime em 29.1.2013, tendo o tribunal concluído pela origem ilícita de bens bem adquiridos antes, pois, como afirmou, a arguida não rebateu a presunção do artigo 9.º da lei 5/2002 para esse período. ii . Estas normas contendem com vários princípios da presunção de inocência: presume os pressupostos de que depende a sua aplicação; distribui o ónus da prova ao arguido; suprime o direito ao silêncio; e resolve o non liquet contra o arguido, consagrados no artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa. Pelo que nestes termos e demais de direito deve ser dado provimento a este recurso.» O Ministério Público contra-alegou, tendo concluído da seguinte forma: «1. Entender – no que respeita à interceção e gravação de conversações ou comunicações telefónicas – que se deve aplicar um regime sancionatório mais rigoroso – o da nulidade absoluta (artigo 190.º do CPP) – quando a violação das regras se situa ao nível dos pressupostos de admissibilidade (artigo 187.º do CPP) do que se essa vio- lação ocorrer ao nível das “formalidades das operações” (artigo 188.º do CPP) – o da nulidade relativa [artigo 120, n.º 3, alínea c) , do CPP] – tem plena cobertura constitucional e está de acordo com a jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre a matéria. 2. Com efeito, verificados os pressupostos, ou seja, respeitado o disposto no artigo 187.º do CPP, e não ocor- rendo, dessa forma, violação do artigo 34.º, n.º 4, da Constituição, para que se continue a mostre cumprida a Constituição no que respeita ao princípio da proporcionalidade (artigo 18.º, n. os 2 e 3, da Constituição) o que é fundamental e decisivo é que haja um acompanhamento judicial continuo e próximo, temporal e material da fonte e que toda a prova obtida por essa via passe pelo “crivo” judicial quanto ao seu caráter não proibido e à sua relevância. 3. Com a ligeira violação – de um dia, num caso e de dois dias no outro – do prazo estabelecido nos n. os 3 e 4 do artigo 188.º do CPP, não é minimamente afrontada aquela exigência constitucional, não sendo, pois, violado o princípio da proporcionalidade. 4. Dessa forma, considerar que o desrespeito daqueles prazos constitui uma nulidade que depende de arguição, nos termos 120.º, n.º 3, alínea c) , do CPP, não é inconstitucional. 5. A norma do artigo 7.º, n.º 1, da lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro, enquanto estabelece que em caso de con- denação pela prática de crime referido no artigo 1.º, e para efeitos de perda de bens a favor do Estado, presume-se constituir vantagem de atividade criminosa a diferença entre o valor do património do arguido e aquele que seja congruente com o seu rendimento lícito, não viola o artigo 32.º, n. os 1 e 2 da Constituição, não sendo, por isso, inconstitucional. 6. Para além de o próprio tribunal dever apreciar, oficiosamente, a prova produzida para, em face da mesma, poder determinar com o máximo de rigor qual a concreta vantagem de atividade criminosa, naturalmente que, não sendo inconstitucional a presunção, o ónus de a ilidir impende sobre o arguido (artigo 9.º da lei n.º 5/2002), não se vislumbrando, pois, qualquer violação Constituição. 7. Consequentemente, deve negar-se provimento ao recurso.» II – Fundamentação 1. Da inconstitucionalidade da interpretação dos artigos 119.º, 120.º, 126.º, 188.º e 190.º do Código de Processo Penal A recorrente pretende ver sindicada a constitucionalidade da interpretação conjugada dos artigos 119.º, 120.º, 126.º, 188.º e 190.º, todos do Código de Processo Penal, no sentido de que a preterição dos prazos
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