TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015
222 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL de Processo Penal e tendo a escuta telefónica sido judicialmente autorizada, as eventuais violações ao disposto no artigo 188.º constituem formalidades processuais, cuja falta de observância não contende com a validade e fidedignidade daquele meio de prova, razão pela qual a violação dos procedimentos previstos no artigo 188.º constitui uma nulidade sanável nos termos previstos no artigo 120.º do Código de Processo Penal. Ou seja, esta posição entende que, não obstante o artigo 190.º do Código de Processo Penal cominar com a sanção de “nulidade” as violações dos artigos 187.º e 188.º do mesmo diploma, importa distinguir os pressupostos substanciais de admissão das escutas (previstos no artigo 187.º), cuja violação é sancionada com nulidade absoluta e, consequentemente, insanável e de conhecimento oficioso, e os requisitos proces- suais da sua aquisição (previstos no artigo 188.º), cuja violação é sancionada com nulidade relativa, sanável e dependente de arguição nos prazos previstos no artigo 120.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal. Tem sido este o entendimento seguido, maioritariamente, pelo Supremo Tribunal de Justiça (no mesmo sentido, cfr. Carlos Adérito Teixeira, “Escutas telefónicas: a mudança de paradigma e os velhos e novos problemas”, in Revista do Centro de Estudos Judiciários , 1.º Semestre de 2008, n.º 9, p. 851; e António Hen- riques Gaspar, José António Henriques dos Santos Cabral, Eduardo Maia Costa, António Jorge de Oliveira Mendes, António Pereira Madeira e António Pires Henriques Graça, Código de Processo Penal Comentado , Coimbra, Almedina, 2014, pp. 851-852). Ainda neste sentido, Paulo Sousa Mendes (cfr. Lições de Direito Processual Penal , Almedina, Coimbra, 2013, p. 190) sustenta que há algumas nulidades de prova reconduzíveis ao sistema das nulidades proces- suais, as quais seguem o regime das nulidades dependentes de arguição previsto no artigo 120.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, como é o caso dos atos cuja invalidade resulta da violação de «meras formalidades de prova», contanto que a nulidade seja cominada nas disposições legais em causa, e aponta como exemplo deste tipo de situações a demora na entrega ao juiz das gravações e transcrições necessárias para se fiscalizar as escutas telefónicas (artigos 188.º, n.º 4, e 190.º do Código de Processo Penal). Segundo outra posição, que tem merecido acolhimento sobretudo na jurisprudência das Relações, deverá ser adotada uma “solução unitária”, devendo ser sancionada com a mesma nulidade quer a violação do disposto no artigo 187.º, quer a violação do disposto no artigo 188.º [sobre a caraterização destas duas soluções jurisprudenciais, cfr. Costa Andrade, “Bruscamente no verão Passado”, a reforma do Código de Processo Penal , Coimbra Editora, pp. 139-144, considerando este Autor que «numa consideração estrita de direito positivo, os créditos da tese unitária (…) parecem mais sólidos»]. Esta é também a posição de André Lamas Leite (cfr. “Entre Péricles e Sísifo: o novo regime legal das escutas telefónicas”, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 17, n.º 4, outubro – dezembro de 2007, pp. 665-669) que sustenta que a introdução pela Lei n.º 47/2007, de 29 de agosto, da locução «não podendo ser utilizadas» na nova redação do n.º 3 do artigo 126.º consagra indiscutivelmente a solução de que a nuli- dade prescrita no artigo 190.º não é uma nulidade em sentido técnico, enquadrável nos artigos 119.º ou 120.º, mas uma nulidade atípica, designada por «proibição de prova», sustentando que o segmento intro- duzido pela referida lei «fulmina com as consequências de “inutilização” todas as provas obtidas em incum- primento da disciplina legal dos meios de obtenção probatórios que contendam com os bens jurídicos nele protegidos, sendo ilegal, desde 15 de setembro de 2007, a interpretação quase unânime da jurisprudência e de alguma doutrina, no sentido da destrinça entre a violação do artigo 187.º e do artigo 188.º como condu- zindo, respetivamente, a uma nulidade insanável ou a uma mera nulidade sanável». Como é sabido, não compete ao Tribunal Constitucional tomar posição no que respeita a esta contro- vérsia, optando por uma das interpretações dos preceitos em análise. Ao Tribunal Constitucional cabe apenas decidir se a norma que se extrai desses preceitos, na interpretação adotada pela decisão recorrida, é ou não desconforme com a Constituição, designadamente, com os seus artigos 18.º, 32.º, n. os 1 e 8, e 34.º, n.º 4. Para a apreciação desta questão de constitucionalidade assumem particular importância, enquanto parâ- metros relevantes, as normas dos artigos 18.º, 32.º, n.º 8 e 34.º, n.º 4, da Constituição. Sendo certo que a referida norma do artigo 32.º, n.º 1, é também fonte autónoma de direitos dos arguidos, constituindo uma “cláusula geral” que engloba todas as garantias de defesa do arguido em processo criminal não expressamente
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