TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

229 acórdão n.º 476/15 É certo que, a entender-se, como sustenta a Recorrente, que o vício em causa constitui nulidade insa- nável, tal conferiria uma mais ampla possibilidade de arguição do mesmo. No entanto, a solução seguida pela decisão recorrida, embora implique um prazo mais limitado para a arguição do vício e faça recair sobre o arguido o ónus de o invocar, manifestamente não implica um cerceamento inadmissível ou insuportável das suas possibilidades de defesa que se tenha de considerar desproporcionado ou intolerável, em termos de consubstanciar uma solução constitucionalmente censurável, na perspetiva do artigo 32.º, n.º 1, da Cons- tituição. Com efeito, um acompanhamento diligente da tramitação processual a partir do momento em que a arguida foi notificada da acusação, permite-lhe detetar a irregularidade em causa, revelando-se o prazo concedido quando não seja requerida a abertura de instrução, apesar de curto, suficiente para a arguição da respetiva nulidade, pelo que não é possível, por isso, afirmar-se que aqueles objetivos de celeridade e econo- mia processuais sejam, neste caso, alcançados à custa de uma intolerável diminuição das garantias de defesa do arguido. Torna-se, assim, manifesto que a interpretação sindicada, ao qualificar o vício em causa nos autos como nulidade relativa, impondo ao interessado a sua arguição dentro de um prazo razoável para poder dar-se plena exequibilidade ao direito de defesa do arguido, não coloca em causa a garantia de tal direito de defesa. Não se vislumbra, assim, que a interpretação normativa questionada, ao qualificar o vício resultante da inobservância dos prazos previstos nos n. os 3 e 4 do artigo 188.º do Código de Processo Penal como nulidade relativa, prevista no artigo 120.º, n.º 2, alínea d) , do Código de Processo Penal, seja incompatível com as garantias de defesa do arguido em processo criminal, consagradas em geral no artigo 32.º, n.º 1, ou com o disposto nos artigos 18.º, 32.º, n.º 8, e 34.º, n.º 4, da Constituição, devendo o recurso, nesta parte, improceder. 2. Da inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 7.º e 9.º, n.º 3, da Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro. A recorrente suscitou a inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 7.º e 9.º, n.º 3, da Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro, na medida em que, em caso de condenação do arguido por um crime de tráfico de estupefacientes, se presume constituir vantagem da atividade criminosa a diferença entre o valor patrimo- nial do arguido e aquele que seja congruente com o seu rendimento lícito (entendendo-se por património do arguido o conjunto dos bens descriminados nas alíneas do n.º 2 do artigo 7.º), e se transfere para o arguido o ónus de ilidir essa presunção, demonstrando a proveniência dos referidos bens. Segundo a recorrente, o regime consagrado nas referidas normas incorre em diversas violações do princí- pio da presunção de inocência, consagrado no artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, uma vez que «presume os pressupostos de que depende a sua aplicação; distribui o ónus da prova ao arguido; suprime o direito ao silêncio; e resolve o non liquet contra o arguido». Esta questão já foi objeto de apreciação pelo Tribunal Constitucional nos Acórdãos n. os  101/15 e 392/15 e que julgaram não inconstitucionais as normas impugnadas. No último destes arestos escreveu-se o seguinte: «(…) importa realçar que o estabelecimento da presunção legal cuja constitucionalidade é sindicada nos pre- sentes autos não tem em vista a imputação ao arguido da prática de qualquer crime e o consequente sanciona- mento, mas sim privá-lo de um património, por se ter concluído que o mesmo foi adquirido ilicitamente, assim se restaurando a ordem patrimonial segundo o direito, o que situa a questão em plano diverso do que foi objeto de análise nos Acórdãos n. os 179/12 e 377/15 deste Tribunal (acessíveis em www.tribunalconstitucional.pt ) . É certo que a aplicação da medida de perda a favor do Estado, a par deste objetivo, tem uma finalidade de prevenção criminal, evitando que se crie a ideia que o crime compensa, assim como a sua aplicação tem como pressuposto necessário a condenação por um dos crimes do catálogo previsto no artigo 1.º da Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro. Contudo, conforme já salientou este Tribunal no referido Acórdão n.º 101/15, só com esta condenação

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