TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

306 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL IV – Não estamos, pois, no seu aspeto dominante, perante uma participação nos gastos gerais da comu­ nidade, em cumprimento de um dever fundamental de cidadania, nem perante a retribuição de um serviço concretamente prestado por uma entidade pública ao sujeito passivo, pelo que a refe- rida “taxa” não se pode qualificar nem como imposto, nem como uma verdadeira taxa, sendo tal tributo antes qualificável como contribuição financeira, não obstando a essa qualificação o facto de o Fundo Sanitário e de Segurança Alimentar Mais, a favor do qual reverte o produto da “taxa de segurança alimentar mais”, não dispor de personalidade jurídica, pois desse ponto de vista o que interessa considerar é o grau de autonomia da entidade que presta o serviço público e à qual se encontra consignada a receita resultante da contribuição financeira, de modo a poder afirmar-se que a receita não será canalizada para a administração geral do Estado ou de outras pessoas coleti- vas territoriais. V – Ora, o Fundo é caraterizadamente uma entidade pública infraestadual, na medida em que é definido como um património autónomo que dispõe de autonomia administrativa e financeira, o que basta para considerar que a “taxa de segurança alimentar mais”, sendo uma contribuição especial não sub- sumível ao conceito de imposto ou taxa é também uma contribuição que reverte a favor de entidade pública e se enquadra na categoria de contribuição financeira a que se refere o artigo 165.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição. VI – Relativamente à questão de saber se uma contribuição financeira como aquela que se encontra prevista no artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 119/2012, de 15 de junho, pode ser criada por diploma do Governo sem autorização legislativa, importa ter em conta que a nova redação do artigo 165.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição, para efeitos de submissão dos diversos tipos de tributo ao princípio da reserva de lei formal, autonomizou a categoria das “contribuições financeiras”, ao lado dos impostos e das taxas, configurando-se assim dois tipos de reserva parlamentar: um relativo aos impostos, que abrange todos os seus elementos essenciais, incluindo a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes, outro restrito ao regime geral, que é aplicável às taxas e às contribuições financeiras, e relativamente às quais apenas se exige que o parlamento legisle ou autorize o governo a legislar sobre as regras e princípios gerais e, portanto, sobre um conjunto de diretrizes orientadoras da disciplina desses tributos que possa corresponder a um regime comum. VII – Com esta alteração deixou de fazer qualquer sentido equiparar a figura das contribuições financeiras aos impostos para efeitos de considerá-las sujeitas à reserva da lei parlamentar, passando o regime destas a estar equiparado ao das taxas; o princípio da legalidade, relativamente às contribuições finan- ceiras, tal como o das taxas, apenas exige que o parlamento legisle ou autorize o governo a legislar sobre as regras e princípios gerais comuns às diferentes contribuições financeiras, não necessitando de uma intervenção ou autorização parlamentar para a sua criação individualizada, enquanto que, rela- tivamente a cada imposto, continua a exigir-se essa intervenção qualificada, a qual deve determinar a sua incidência, a sua taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes. VIII– Aquele regime geral das contribuições financeiras, cuja definição compete à Assembleia da República, deve conter os seus princípios estruturantes, bem como as regras elementares respeitantes aos seus elementos essenciais comuns, sendo previsível a necessidade de elaborar diferentes regimes gerais para cada um dos tipos destas múltiplas figuras tributárias; porém, relativamente à “taxa de segurança alimentar mais” não se descortina qualquer intervenção da Assembleia da República que habilitasse minimamente o Governo a proceder à sua criação, nem a mesma resulta de uma imposição específica

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