TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015
309 acórdão n.º 539/15 d) Mesmo que, porém, se não entenda estarmos perante uma verdadeira taxa, no caso dos autos, estaremos, seguramente, perante uma contribuição financeira, ou seja, um tributo parafiscal, subtraído, porém, tal como a taxa, ao princípio da reserva de lei formal. e) A circunstância de não existir um regime geral para as contribuições financeiras não obsta a que o Governo, no uso das competências que lhe são conferidas pelo artigo 198.º da Constituição, as possa criar. f ) De facto, não se compreenderia que essa falta impedisse o Governo de prover rapidamente às inúmeras situações com que se depara constantemente para a resolução de assuntos premente e aos quais acorre de formas diversas, sendo que uma delas é através da prestação de serviços distintos, particularizados e que necessitam de ser pagos. g) No entanto, só através de uma entorse ao disposto no artigo 165.º n.º 1 alínea i) da CRP, é que podere- mos separar as taxas das contribuições em ordem a exigir, para estas, aquilo que se não exige àquelas e, sobretudo, em ordem a exigir que se imponha uma reserva de competência legislativa onde ela não existe e, expressamente, não foi querida. h) Entendemos, pois, que a criação de contribuições pode, ainda que não exista o respetivo regime geral, ser realizada pelo Governo através de ato legislativo próprio, como foi o caso da TSAM. i) O Decreto-Lei 119/2012 não é, pois, organicamente inconstitucional.» A Recorrida contra-alegou, concluindo do seguinte modo: «A. A TSAM não cabe na noção de taxa: não existe no seu funcionamento qualquer vantagem específica direta para os próprios sujeitos passivos, de modo a poder concluir-se pela existência de uma relação de correspecti- vidade ou sinalagmaticidade entre eles e o serviço público prestado. B. Muito pelo contrário, os beneficiários diretos são os bens públicos da confiança de todos na qualidade dos bens alimentares produzidos e distribuídos: só a título meramente reflexo (por serem operadores de um setor cuja credibilidade beneficiará do controlo exercido pelo Estado) podemos dizer que a TSAM beneficia cada um dos operadores que a ela estão sujeitos (os quais, de resto, constituem um grupo bastante restrito do uni- verso de todos os agentes económicos que beneficiam do controlo estatal). C. Este afastamento da TSAM do conceito de taxa é claramente vincado nas opiniões dos dois jurisconsultos juntas aos autos, quer em primeira instância quer com estas contra-alegações. D. Ora, uma vez que não é uma verdadeira taxa, a TSAM há de ser dogmaticamente enquadrada ou no campo dos impostos propriamente ditos ou no do tertium genus contribuições financeiras. E. De um lado, são óbvias as afinidades e contactos do encargo em causa com a noção de imposto: é que, apesar de a sua imposição não vir fundada no dever de contribuição para a atividade estadual em geral, ele constitui, ainda assim, o financiamento de uma atividade do Estado vocacionada para a satisfação de necessidades públicas, assente mais na dimensão de solidariedade própria da figura dos impostos do que em qualquer vínculo de correspectividade específica, característico das taxas, o qual, como se disse, não é neste caso minimamente discernível. É esta, precisamente, a opinião do Prof. Casalta Nabais, no Parecer junto aos autos, incluindo na adenda que acompanha as presentes contra-alegações: em concreto, entende o Autor que a TSAM configura um imposto especial sobre o rendimento das empresas de grande distribuição. F. Do outro lado, o tributo tem igualmente características que o podem situar no interior do vasto território dogmático intermédio das contribuições financeiras. É como tal que o Prof. Sérgio Vasques vê a TSAM, no seu Parecer. G. A criação de impostos encontra-se imediatamente sujeita ao princípio da legalidade, no sentido de que cada um deles, e respetivos elementos essenciais, devem ser aprovados por lei da Assembleia da República ou por decreto-lei por esta autorizado [alínea i) do artigo 165.º e n. os 2 e 3 do artigo 103.º da Constituição]. H. Pelo contrário, a concreta criação de taxas e de contribuições financeiras é atualmente efetivável por diploma legislativo governamental não autorizado, desde que isso se faça dentro dos limites e das diretrizes definidas na respetiva lei-quadro competente (em boa verdade, tendo sido definido o regime geral desses tributos, com
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