TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

338 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Se se apurar que o conteúdo da norma impugnada descreve um facto gerador da obrigação tributária, naturalmente que tem que ser qualificada como norma de incidência tributária abrangida pelo princípio da reserva de lei parlamentar. A exigência de reserva de lei em matéria tributária, que tem origem no princípio da autotributação dos impostos e fundamento justificativo na garantia dos direitos fundamentais dos contri- buintes, abrange necessariamente os chamados elementos essenciais dos impostos. Com efeito, o princípio da legalidade fiscal está expressamente consagrado na Constituição na vertente de reserva material de lei formal: no artigo 168.º, n.º 1, alínea i) , que reserva à exclusiva competência da Assembleia da República, salvo autorização ao Governo, legislar sobre a criação de impostos e sistema fiscal (princípio da reserva de lei formal); e no artigo 103.º, n.º 2, que estabelece que os impostos são criados por lei, que determina a incidên- cia, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes (princípio da reserva material). Ora, o facto ou situação que dá origem ao imposto – o facto tributário – é o facto que concretiza as normas de incidência subjetiva e objetiva, produzindo com isso o nascimento da obrigação fiscal (cfr. n.º 1 do artigo 36.º da Lei Geral Tributária). Daí que as normas que enunciam os pressupostos de cuja conjugação resulta o nascimento da obrigação tributária, assim como os elementos dessa mesma obrigação, sejam nor- mas disciplinadoras dos elementos essenciais dos impostos. Nos impostos especiais sobre o consumo, a obrigação tributária nasce a partir da produção ou impor- tação, mas apenas se torna exigível com a introdução no consumo (cfr. artigos 6.º e 7.º do CIEC de 99 – Decreto-Lei n.º 566/99, de 22 de dezembro – e artigos 7.º e 8.º do atual CIEC – Decreto-Lei n.º 73/2010, de 21 de junho). Em conformidade com a legislação comunitária, a chamada Diretiva Horizontal – Diretiva n.º 92/112/CE, de 25 de fevereiro – que foi substituída pela atual Diretiva n.º 2008/118/CE, de 16 de dezembro, entre o momento em que se considera nascida a obrigação tributária e o momento da sua exi- gibilidade, o imposto encontra-se suspenso. Decorre daqui que uma das principais particularidades destes impostos monofásicos, objeto de harmonização comunitária, é precisamente o regime de suspensão, através do qual se permite que os produtos tributáveis circulem no território comunitário e sejam armazenados em entrepostos fiscais sem pagamento imediato do imposto. O regime suspensivo, que foi inspirado no direito aduaneiro, é pois um dos instrumentos essenciais para assegurar os princípios comunitários nesta matéria, especialmente a tributação no destino, uma vez que permite aproximar o imposto do momento e local do consumo. Não obstante o desfasamento temporal que existe entre o momento da produção e importação dos produtos tributáveis – o facto gerador do imposto – e o da introdução no consumo – quando ele se torna exigível – este é o momento mais relevante na aplicação do imposto, pois é ele que situa no tempo e no espaço a obrigação tributária, determinando o Estado com competência para tributar e a taxa a aplicar (cfr. n.º 3 do artigo 7.º do CIEC). Assim, a introdução no consumo, apesar de configurada na lei como condição de exigibilidade, surge como um dos momentos constitutivos da relação jurídica tributária, sem o qual não existe crédito de imposto. Como refere Sérgio Vasques, «a obrigação tributária resulta antes da conjugação dos dois factos, o fabrico e a introdução no consumo – um pressuposto complexo, de formação progressiva, resultante da combinação necessária de dois elementos, ao último dos quais cabe a função de aperfeiçoar a fattispecie tributária. Por outras palavras: a obrigação de imposto não se pode considerar nascida senão aquando da introdução no consumo» (cfr. Os Impostos Especiais de Consumo, Almedina, p. 303). Ora, se o verdadeiro facto gerador do imposto está na introdução no consumo, impõe-se então exami- nar se a norma impugnada interfere com esse elemento essencial, criando novas hipóteses de introdução no consumo ou modificando as já existentes. 6. A norma do n.º 6 do artigo 86.º do CIEC, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 155/2005, proíbe que os operadores económicos introduzam mensalmente no consumo as quantidades de produtos de tabaco manufaturado que excedam em mais de 30%, por cada marca, a média mensal das introduções feitas no ano anterior. O sentido expresso do enunciado normativo é o de impor uma nova “regra de condicionamento” na comercialização do tabaco, vedando aos operadores económicos do setor a possibilidade de colocar à

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