TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

339 acórdão n.º 545/15 disposição dos consumidores as quantidades de tabaco que sejam convenientes ou necessárias à sua gestão comercial. O sentido desta regra de condicionamento e o contexto que esteve na sua génese estão claramente afir- mados nos três parágrafos do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 155/2005: «O aumento das taxas do imposto incidente sobre os tabacos manufaturados que ocorre geralmente com a publicação da Lei do Orçamento do Estado, sendo anual e previsível, tem vindo a encorajar os operadores econó- micos a acumularem stocks excedentários de produtos de tabaco, durante os meses que antecedem o aumento das taxas do imposto. Esses stocks de produtos são antecipadamente introduzidos no consumo, contornando-se assim a aplicação das novas taxas do imposto, o que permite que os operadores económicos possam comercializar, ao longo do ano económico seguinte, os produtos a preços artificialmente mais baixos, potenciando, por esta via, distorções ao nível da concorrência. Considerando que a introdução no consumo de produtos de tabaco manufaturado está diretamente ligada à efetiva comercialização dos produtos referidos e que as referidas condutas, reiteradamente levadas a efeito, subver- tem aquela relação, importa disciplinar esta matéria, com vista a garantir uma maior transparência no mercado e obstar a práticas lesivas das receitas do Estado». Como se vê, o contexto que esteve pressuposto na norma foi o comportamento que os operadores eco- nómicos tinham perante o conhecimento prévio do agravamento das taxas sobre o consumo de tabaco no ano económico seguinte. Sabendo, através da leis do Orçamento do Estado, que o imposto incidente sobre o tabaco iria aumentar, os operadores económicos introduziam no mercado, nos últimos meses de cada ano, quantidades excessivas desse produto que apenas seriam efetivamente consumidas nos primeiros meses do ano seguinte. Esta prática tinha efeitos económicos vantajosos para os operadores económicos e consumido- res, já que podiam comercializar e adquirir tabaco por preço inferior ao verificado no momento do consumo efetivo, mas ao mesmo tempo era prejudicial aos interesses financeiros do Estado, já que não arrecadava o montante de imposto que havia estimado no Orçamento do Estado. Não é de algum modo evidente que o objetivo prático da norma tenha sido o de evitar «distorções ao nível da concorrência» ou de «garantir uma maior transparência no mercado», pois os operadores económi- cos encontravam-se em situação igualdade quanto à introdução no consumo desses produtos. Do ponto de vista económico, apenas ocorria uma antecipação da oferta e da procura desses produtos nos meses finais de cada ano económico, evitando-se desse modo o previsível agravamento do imposto. Essa prática, que era acessível a todos operadores, tinha reflexos negativos nas receitas fiscais, uma vez que inviabilizava a liquida- ção e cobrança do montante de imposto sobre o consumo de tabaco que estava inscrito na Lei do Orçamento do Estado. É pois o interesse em impedir essa forma de atuação que torna compreensível a regra de condi- cionamento imposta pela norma impugnada: «obstar a práticas lesivas das receitas do Estado». O legislador introduziu essa regra tendo em vista garantir que a previsão de receitas do imposto sobre o consumo de tabaco possa ser plenamente realizada no termo do ano económico. Sendo esta a razão de ser da norma impugnada, desde logo fica afastada a qualificação como norma de incidência lato sensu , seja como regra definidora do facto gerador do imposto, seja como regra que fixa o critério da sua exigibilidade. O conceito de “introdução no consumo” enunciado no n.º 6 do artigo 86.º não diverge das hipóteses referidas nos artigos 7.º, n.º 1, e 86.º, n.º 1, do CIEC. A norma não incorpora novos factos ou novas hipóteses de introdução no consumo, para além das enunciadas nessas disposições, uma que vez que, dentro dos limites quantitativos fixados, o facto gerador do imposto e a condição da sua exigibilidade continuam a ser os previstos naquelas normas. Na sua previsão, a norma limita-se a proibir a introdução no consumo de tabaco em quantidades superiores a 30% à média mensal que foi comercializada no ano económico anterior, relativamente a cada marca. Uma típica regra de condicionamento comercial,

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