TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015
35 acórdão n.º 494/15 Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. O Provedor de Justiça, ao abrigo do disposto nos artigos 281.º, n.º 2, alínea d) , da Constituição, requereu ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da «norma constante da alínea b) do n.º 3 do artigo 364.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, bem como, consequentemente, da norma constante do n.º 6 do mesmo artigo 364.º da LTFP, na parte aplicável, em ambas as disposições, à outorga pelos mem- bros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública dos acordos coletivos de empregador público no âmbito da administração autárquica». Considera o Provedor de Justiça que as referidas normas violam o princípio da autonomia local acolhido no artigo 6.º, n.º 1, bem como os termos delimitados para a tutela administrativa contidos no artigo 242.º, n.º 1, ambos da Constituição. X – Embora na solução normativa sob análise o Governo se encontre numa posição negocial paritária à das autarquias, na medida em que estas são forçadas a obter o seu assentimento (pois a sua falta impe- de a celebração do acordo), este pode influenciar decisivamente o acordo, levando as normas objeto de fiscalização a uma absoluta subalternização do poder decisório autárquico face ao juízo de valor do Governo; ora, o propósito da consagração constitucional da existência de pessoal próprio, dotado de um regime legal adaptado à realidade autárquica, é precisamente a garantia do caráter autónomo da administração local, permitindo às autarquias não depender da hierarquia da administração central no seu relacionamento (singular ou coletivo) com os respetivos trabalhadores. XI – Atentos o conteúdo e o alcance da norma impugnada é certo que não estamos perante a instituição de uma relação de tutela de mérito, pois não se atribui a membros do Governo um poder de controlo sobre a atuação da autarquia, mas sim uma competência própria de decisão sobre o conteúdo das declarações negociais que, pela parte do empregador público, são apresentadas à contraparte; ainda assim, tal não basta para se considerar respeitada a garantia da autonomia local; se a Constituição limi- ta a tutela administrativa sobre as autarquias à «verificação do cumprimento da lei», pode daí retirar-se uma conclusão mais abrangente: a rejeição constitucional de uma intervenção controladora do mérito da atuação autárquica no que respeita aos seus poderes de autonomia. XII – A participação de membros do Governo em acordos coletivos de empregador público das autarquias visa a definição, em conjunto com a entidade autárquica, da posição negocial a adotar pelos sujeitos que contratam “pelo empregador público”, configurando uma limitação da autonomia local quanto ao seu quadro de pessoal próprio, que exige o tratamento das autarquias como empregadores públicos autónomos, no âmbito dos poderes e deveres definidos na LTFP; a autonomia local, nos seus vários elementos, só pode ser limitada por vinculações legais que o justifiquem; a atuação prevista na norma impugnada (a intervenção administrativa direta do Governo, face a um caso concreto, efetuando juí- zos de mérito), injustificada pelos interesses públicos em presença, é uma restrição que viola, de modo frontal, o princípio da autonomia local, previsto no artigo 6.º, n.º 1, da Constituição.
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