TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

355 acórdão n.º 569/15 Dado o caráter ou função instrumental dos recursos de fiscalização concreta, exige-se, para que o recurso tenha efeito útil, que haja ocorrido efetiva aplicação pela decisão recorrida, da norma ou interpretação nor- mativa cuja constitucionalidade é sindicada. É necessário, pois, que a interpretação acusada de inconsti- tucionalidade tenha constituído ratio decidendi da decisão recorrida, pois, só assim, um eventual juízo de inconstitucionalidade poderá determinar uma reformulação dessa decisão. Verificada a falta de aplicação efetiva, pelo tribunal a quo, da interpretação normativa indicada pelo recorrente, importa concluir que não está preenchido este requisito de admissibilidade do recurso de cons- titucionalidade previsto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b) , da LTC, relativamente a este segmento do recurso. Pelo exposto, não deve ser conhecido o recurso nesta parte. 2. Do mérito do recurso De acordo com o requerimento de interposição de recurso, o recorrente pretende ver apreciada a questão da constitucionalidade material «da norma extraída dos artigos 103.º, n.º 2, alínea f ) , e 104.º, n. os  1 e 2, do Código de Processo Penal, se interpretada no sentido de permitir que seja declarada urgência relativamente a um processo no qual a audiência de discussão e julgamento já foi realizada e já terminou, determinando o caráter urgente dos prazos processuais aplicáveis aos atos a praticar pelos sujeitos processuais». Segundo o recorrente, tal interpretação resulta na aplicação imprevista, inusitada e inesperada, contra o teor literal dos referidos preceitos, de um regime de prazo que corre em férias judiciais, prejudicando desta forma o exercício efetivo do contraditório. Acrescenta ainda que o despacho do tribunal de 1.ª instância con- feriu caráter urgente aos presentes autos com fundamento num dispositivo legal [artigo 103.º, n.º 2, alínea f ) , do Código de Processo Penal] que não permite atribuir natureza urgente ao processo de forma genérica, e muito menos permite impor aos sujeitos processuais ( maxime , os arguidos) a prática de atos fora de dias úteis, horas de expediente dos serviços de justiça e dentro do período de férias judiciais. Sustenta, por isso, que tal interpretação normativa é violadora dos princípios da confiança e da segu- rança jurídica, bem como do princípio da igualdade, vertidos nos artigos 1.º a 3.º, 20.º, n.º 4, e 32.º, n. os  1 a 3 e 5, da Constituição. Antes de mais, importa ter em atenção o teor dos preceitos legais a que se reporta a interpretação nor- mativa questionada. O artigo 103.º do Código de Processo Penal, sob a epígrafe «Quanto se praticam os atos», dispõe o seguinte nos seus n. os 1 e 2: «1 – Os atos processuais praticam-se nos dias úteis, às horas de expediente dos serviços de justiça e fora do período de férias judiciais. 2 – Excetuam-se do disposto no número anterior: a) Os atos processuais relativos a arguidos detidos ou presos, ou indispensáveis à garantia da liberdade das pessoas; b) Os atos de inquérito e de instrução, bem como os debates instrutórios e audiências relativamente aos quais for reconhecida, por despacho de quem a elas presidir, vantagem em que o seu início, prosseguimento ou conclusão ocorra sem aquelas limitações; c) Os atos relativos a processos sumários e abreviados, até à sentença em primeira instância; d) Os atos processuais relativos aos conflitos de competência, requerimentos de recusa e pedidos de escusa; e) Os atos relativos à concessão da liberdade condicional, quando se encontrar cumprida a parte da pena necessária à sua aplicação; f ) Os atos de mero expediente, bem como as decisões das autoridades judiciárias, sempre que necessário. g) Os atos considerados urgentes em legislação especial.».

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