TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015
374 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL jurisdicional de reação próprio contra decisões de mérito proferidas por uma formação de três juízes ou pelo juiz singular, no quadro das suas competências próprias de julgamento (artigo 40.º, n. os 1 e 3, do ETAF), e que não se confundem a competência delegada do juiz singular quando intervém como relator, que apenas pode proferir decisões sumárias quando a questão de direito a resolver seja simples. Não é possível afirmar, por isso, dentro do quadro competêncial legalmente definido, que a reclamação para a conferência «é especificamente aplicável nas situações em que as decisões (…) são proferidas pelo relator», de modo a poder concluir-se que há sempre lugar a reclamação para a conferência das decisões do relator e que dos acórdãos da conferência é que pode recorrer-se, nos termos gerais. Não podendo falar-se de uma relação de especialidade entre as normas em causa, as dúvidas interpre- tativas a que se referia o Acórdão n.º 124/15 subsistem e colocam-se em vários planos. Em primeiro lugar, embora o modelo de competência funcional do relator nos tribunais administrativos de primeira instância tenha sido transposto dos recursos em processo civil, a situação não é inteiramente equivalente à que se veri- fica com a intervenção do relator nos tribunais superiores. Aí sabe-se que o processo é julgado por três juízes e que qualquer decisão que não seja emitida pela formação de julgamento, mas pelo relator a título individual, é passível de reclamação para a conferência. Nos tribunais administrativos de primeira instância, as questões relacionadas com a intervenção do relator não se colocam com a mesma linearidade: o julgamento pode ser efetuado pelo juiz singular no uso de competência própria ou por uma formação de três juízes ou ainda pelo juiz singular no uso da competência delegada. E o meio de reação para qualquer destes casos não é idêntico: há lugar a recurso para o tribunal superior ou a reclamação para a conferência, consoante o órgão judiciário que tenha intervindo e a qualidade em que tenha intervindo. Introduz-se, desde logo, um maior grau de dúvida quanto à definição do órgão judicial interveniente face às diferentes regras de competência, e um estado de incerteza objetiva quanto ao meio de reação, o qual se acentua quando o relator intervém fora do contexto processual que se encontra estritamente delimitado pelo artigo 27.º, n.º 1, alínea i) , e, extravasando a competência do órgão colegial, profere de decisão de mérito que se não confina a questão simples. O Acórdão do Plenário pretende superar a dúvida adotando um sentido interpretativo que não tem qualquer correspondência com a letra da lei e a unidade do sistema jurídico, e, para aferir a determinabi- lidade da lei, faz recair sobre os sujeitos processuais o ónus de efetuarem, na prática judiciária, essa mesma interpretação, apesar de não ser consentânea com os princípios da hermenêutica jurídica. 3. O Acórdão refere ainda que a previsão legal de um menor prazo para deduzir a reclamação (10 dias), relativamente ao que é concedido para a interposição de recurso (30 dias), não traz como necessária a consequência a perda do direito ao recurso, quando este seja exercido para além do prazo concedido para a reclamação, admitindo-se, numa certa linha interpretativa, a possibilidade de «convolar o meio utilizado para o meio devido». Parece depreender-se deste excerto que a interpretação da norma do artigo 27.º, n.º 1, alínea i) , do CPTA, segundo a qual da «sentença proferida por tribunal administrativo e fiscal, em juiz singular, com base na mera invocação dos poderes conferidos por essa disposição, não é suscetível de recurso jurisdicional, mas apenas de reclamação para a conferência nos termos do n.º 2 desse artigo», não gera qualquer consequência cominatória desfavorável para a parte, visto que sempre será possível, numa certa linha interpretativa, con- volar o recurso em reclamação apesar de deduzido fora do prazo perentoriamente fixado para o efeito. Não ocorreria, por isso, violação do princípio do processo equitativo uma vez que não seria imposto à parte o ónus excessivo da perda do direito de recorrer. Para assim concluir, o Acórdão acolhe o entendimento de Armindo Ribeiro Mendes que, em anotação ao acórdão de uniformização de jurisprudência do STA n.º 3/2012, defendeu a ideia de que, ainda que fosse exigível a reclamação para a conferência, deveria convolar-se em reclamação a peça processual que contivesse o requerimento de interposição de recurso e a sua alegação, independentemente de ter sido entregue para
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