TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

383 acórdão n.º 590/15 milhões de euros mas não tem, nesse acervo, qualquer imóvel com VPT superior a 1 milhão, não suporta um cêntimo que seja deste imposto; b) De um lado, a recorrente, que possui um imóvel cujo VPT ultrapassa, ainda que por pouco, € 1 000 000; de outro, o hipotético “contribuinte Alberto” que, por um acaso, possui dez (10) imóveis cujo VPT é de € 990.000,00. 9. A desigualdade vertical é por demais chocante, porquanto a recorrente, que possui um património no valor de cerca de 1 milhão e 250 mil euros, suporta o Imposto do Selo; um hipotético “contribuinte Bernardo”, que possui património no valor de 20 milhões de euros, não suporta um cêntimo que seja deste imposto. 10. E igualmente choca a desigualdade horizontal: a recorrente, que possui um (1) imóvel cujo VPT ultrapassa, ainda que por pouco, € 1 000 000, paga Imposto do Selo outro, hipotético “contribuinte Alberto” que, por um acaso, possui dez (10) imóveis cujo VPT é de € 990 000, não paga um cêntimo de imposto. 11. Em suma, o princípio da igualdade tributária pode ser concretizado através de vertentes diversas: a) Na generalidade da lei de imposto, na sua aplicação a todos sem exceção; b) Na uniformidade da lei fiscal, no tratar de modo igual os contribuintes que se encontrem em situações iguais e de modo diferente aqueles que se encontrem em situações diferentes, na medida da diferença, a aferir pela capacidade contributiva; c) Por último, mas não menos relevante para o caso em apreço, o princípio da igualdade concretiza-se na proibição do arbítrio, no vedar a introdução de discriminações entre contribuintes que sejam desprovidas de fundamento racional. 12. Ora, se a norma do Ponto 28 da TGIS é geral (isso admite-se), em tudo o mais falece. É iniqua, pois trata de forma igual quem é diferente e de forma diferente quem é igual, é assistemática e arbitrária na sua aplicação. 13. Por mais belas e nobres que hajam sido as intenções do legislador, ao criar o tributo plasmado no ponto 28 da TGIS (do que duvidamos, como acima deixamos intuir), o facto é que a repercussão desta norma na ordem jurídica, a sua integração na ordem social que visa compor, resulta num abcesso, violador de princípios tão funda- mentais e basilares da lei fundamental como é o princípio da igualdade. – Artigo 6.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro – Violação do princípio da segurança jurídica, da proibi- ção constitucional da retroatividade da lei fiscal e do princípio da proporcionalidade 14. “O princípio da legalidade, os princípios materiais que constitucionalizam os pontos essenciais da lei fiscal e a necessidade de encontrar, na lei, o fundamento direto da decisão administrativa convergem para um único sentido: assegurar a racionalidade dos comportamentos privados. Tal tem como condição a previsibilidade da lei fiscal (…) e a calculabilidade dos encargos tributários.” 15. Estamos perante um imposto criado em 30 de outubro, cujo facto tributário se verifica no dia seguinte ao da sua criação, e que deve ser pago em cerca de 30 dias. 16. No caso vertente a violação do princípio da segurança jurídica é tanto mais evidente na medida em que este imposto viola mesmo um dos princípios dele decorrente – o princípio da irretroatividade da lei fiscal 17. Na prática, estamos perante um fenómeno de retroatividade material, basta atentar no caso de um qualquer agente económico que concretizou, em meados de setembro de 2012, a aquisição de um imóvel que veio a ser sujeito a este imposto. Nessa data – tão próxima da criação do imposto – ‘’(…) o titular do prédio não podia contar com a aplicação (do imposto), pela razão simples de que tal tributo não havia ainda sido criado” (cfr. Acórdão TC 63/96, 24/01/2006, sobre uma questão de aplicação da Contribuição Especial). 18. É certo que vem o Venerando Tribunal entendendo que o postulado no citado preceito da Constituição respeita apenas à chamada “retroatividade autêntica”, ou seja, aplicação de lei fiscal nova a facto antigo, verificado na vigência de lei anterior. Mas tal não significa que outros casos, em que se verifica retroatividade material, inau- têntica, imprópria, etc., sejam por isso conformes à Constituição.

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