TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015
39 acórdão n.º 494/15 pré-definidas, livre e plenamente às autarquias locais e em vista dos interesses próprios das respetivas populações – interesses que, justamente, «entranham as razões de proximidade, responsabilidade e controlabilidade que propor- cionam a auto-organização», no dizer desse Tribunal, no Acórdão n.º 432/93 (publicado no Diário da República , II Série, n.º 193, de 18 de agosto de 1993). 34.º Efetivamente, situamo-nos em domínio no seio do qual se afirma, em plenitude, a “individualidade jurí- dica das autarquias como sujeitos empregadores”, atuantes em um patamar de conformação normativa, mediante instrumento de regulamentação coletiva, que, pela sua própria natureza e tal como legislativamente autorizado, consubstancia um espaço de derrogação permitida a determinados aspetos do regime laboral “geral”, bem como de consentida contratualização autonomamente austada entre o empregador público e os seus trabalhadores, através das associações sindicais. 35.º Acresce que esta abertura a regimes diferenciados, consentânea com a extroversão da relação de emprego público titulada por contrato de trabalho em funções públicas a mecanismos de contratação coletiva enquanto instrumentos de autogestão de relações laborais, tradicionalmente circunscrito ao mundo das relações de trabalho privadas, é perspetivada pelo próprio legislador como integrando aquele núcleo essencial estatutário em matéria de trabalho em funções públicas, atento o elenco do já citado artigo 3.º da LTFP. 36.º Neste sentido, está interdito um mecanismo de bloqueio, a jusante, desse poder e liberdade de contratação coletiva, como é aquele que flui da alínea b) do n.º 3 do artigo 364.º da LTFP, sempre que ocorra a discordância do Governo quanto ao teor do acordo coletivo a celebrar. 37.º Isto, porquanto, é de todo impensável, em conformidade com o sentido da doutrina constitucional, anterior- mente exposta, uma intervenção do Governo na esfera da celebração de acordos coletivos de empregador público, no âmbito da administração autárquica, que extravase uma tutela administrativa para “verificação do cumprimento da lei por parte dos órgãos autárquicos”, como se define no n.º 1 do artigo 242.º da Lei Fundamental, sob pena de violação do mesmo. 38.º Repito, se a outorga de um acordo coletivo de empregador público, no âmbito da administração autárquica, depende, obrigatoriamente, por força das regras de legitimidade fixadas naquele preceito, da concordância dos refe- ridos membros do Governo, a falta de anuência destes acarreta necessariamente a impossibilidade de vigência do acordo coletivo que acomode as relações laborais entre a autarquia local e os seus trabalhadores, assim se espoliando uma dimensão irrecusável da garantia da autonomia local, tal como gizada na Constituição. 39.º As regras de legitimidade, da parte do empregador público, vertidas na alínea b) do n.º 3 do artigo 364.º da LTFP, equivalem pois a uma medida de sujeição dos acordos coletivos de empregador público, na esfera da administração autárquica, a uma espécie de autorização ou juízo de mérito do Governo, aniquiladora, no limite e enquanto prerrogativa de veto em matéria que releva da gestão do pessoal das autarquias locais, daquela «ideia de responsabilidade autónoma na gestão de um universo de interesses próprios que tem que ver com a essencialidade da autonomia», para me socorrer de passagem do Acórdão n.º 432/93 desse Tribunal, anteriormente invocado.
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