TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015
491 acórdão n.º 601/15 A irrelevância dos erros materiais da decisão judicial para a verificação do pressuposto da exaustação dos recursos ordinários resulta implicitamente da jurisprudência constitucional acima referida sobre a inclusão dos incidentes pós-decisórios no conceito de “recurso ordinário”. Os casos julgados nessa jurisprudência respeitaram sempre a recursos de constitucionalidade interpostos na pendência de incidentes de arguição de nulidade de decisões judiciais (i) em que se punha em causa nessa arguição a decisão recorrida quanto a normas cuja inconstitucionalidade se pretendia ver apreciada (Acórdão n.º 534/04); (ii) «quando estava em causa em apreciação um incidente que poderia interferir no conteúdo dispositivo da decisão recorrida» (Acórdão n.º 286/08); (iii) «quando os incidentes suscitados pelos reclamantes eram abstratamente suscetí- veis de interferir na totalidade do conteúdo dispositivo do acórdão recorrido e mesmo na sua subsistência» (Acórdão n.º 377/11); (iv) «arguições de vícios da decisão recorrida, suscetíveis, em abstrato, de afetar a subsistência da própria decisão» (Acórdão n.º 177/12); (v) arguição da «invalidade do acórdão recorrido, por efeito de nulidade insanável que afetaria a sua subsistência» (Acórdão n.º 732/14). Em todos estes casos de interposição simultânea de recurso de constitucionalidade e dedução de incidentes pós-decisório conside- rou-se que não estavam esgotados os meios impugnatórios “ordinários” porque, em face da argumentação invocada, a decisão do incidente poderia repercutir-se na decisão recorrida, de modo que, no momento da interposição, a mesma carecia de definitividade. Mas como referimos, isso não acontece quando o incidente pós-decisório visa a correção de erros materiais. No caso sub judice , a reclamação incidental teve por objeto a falta de assinatura do acórdão por um dos membros do coletivo que julgou o recurso e um erro material na parte do acórdão em que se faz referência à norma da alínea a) do n.º 2 do artigo 408.º do Código Penal, escrevendo-se “se o recorrente não depositar o seu valor” quando se quis escrever “se o recorrente depositar o seu valor”. Tratou-se, pois, de um lapso manifesto que não têm interferência na substância ou na fundamentação da decisão e que podiam ser corri- gidos a todo tempo. De modo que considerar como “não definitiva” a decisão jurisdicional que padece desse tipo de defeitos materiais, para além de tornar indefinido o prazo de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, afrontaria desnecessária e excessivamente a economia processual em que se funda o princípio da exaustação de recursos ordinários. 7. A segunda questão obstativa ao conhecimento do objeto do recurso, e sobre a qual a recorrente foi convidada a pronunciar-se, pugnando pela sua improcedência, respeita ao pedido de inconstitucionalidade da norma constante da alínea b) do n.º 4 do artigo 554.º do Código do Trabalho, «interpretada no sentido de que estipula um valor tabelado, isto é, um limite mínimo e máximo do montante de coima, a aplicar a empresas com um volume de negócios igual ou superior a € 500 000 e inferior a € 2 500 000, sem ter em consideração o prejuízo que essa mesma empresa teve no ano da declaração de rendimentos». Tendo o recurso de constitucionalidade sido interposto ao abrigo da alínea b) , do n.º 1, do artigo 70.º, da LTC, é necessário que a recorrente, a par do esgotamento dos recursos ordinários tolerados pela decisão recorrida, tenha suscitado, durante o processo e de forma adequada, uma questão de constitucionalidade que incida sobre normas jurídicas que hajam sido ratio decidendi daquela decisão. Ora, o acórdão recorrido não fez aplicação da referida “dimensão normativa” como ratio decidendi da questão que foi chamado a apreciar. Com efeito, o tribunal a quo não tinha para resolver, nem efetivamente resolveu, se os escalões de gravidade das contraordenações laborais previstos no artigo 554.º do CT, além do volume de negócios da empresa e do grau de culpa do infrator, também devem variar em função do pre- juízo que a empresa tem no ano da declaração de rendimentos. Da análise dos autos resulta que a recorrente não logrou, em qualquer momento, confrontar o tribunal recorrido com a questão de constitucionalidade referente à norma do artigo 554.º, n.º 4, alínea b) , do CT, naquela interpretação normativa. A recorrente limitou-se, a fls. 379 e 380 dos autos, a suscitar uma questão de constitucionalidade diversa, referente à mesma norma, mas no sentido de prever montantes de coimas que, no seu entender, violam o princípio da proporcionalidade. Refere, nesse sentido, que «não foi certamente intenção de legislador punir a prática de determinada infração com coimas tão elevadas que desincentive ou ponha em risco a continuação da
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