TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015
515 acórdão n.º 620/15 – fração autónoma mais partes comuns – tem autonomia jurídica e, como tal, pode ser objeto de uma situa- ção jurídica real própria». Estamos, pois, perante realidades com um estatuto jurídico distinto, em que a titularidade dos direi- tos reais referidos da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo que incidem sobre as frações de um prédio constituído em propriedade horizontal podem pertencer a diferentes pessoas, enquanto num prédio constituído por unidades suscetíveis de utilização independente, mas que não se encontra constituído em propriedade horizontal, essa titularidade é necessariamente da(s) mesma(s) pessoa(s). Assim, sendo inegável que, no plano do direito civil, estamos perante duas situações juridicamente diferentes, importa, no entanto, questionar se tais diferenças justificam um tratamento diferente no plano tributário, ou seja, se tais diferenças jurídicas existem e são relevantes também no plano substancial para efei- tos fiscais, a ponto de se poder afirmar que, em termos económicos, estamos perante diferentes manifestações de capacidade contributiva. Como vimos, com a alteração legislava sobre a qual incidiu a interpretação sub iudicio , conforme resulta quer da exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 96/XII, que esteve na origem da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, bem como da sua discussão na generalidade na Assembleia da República, o legislador teve o propósito de «reforçar o princípio da equidade social na austeridade, garantindo uma efetiva repartição dos sacrifícios necessários ao cumprimento do programa de ajustamento» e de «garantir que a repartição desses sacrifícios será feita por todos e não apenas por aqueles que vivem do rendimento do seu trabalho». Para tal, decidiu através do referido diploma legislativo alargar «a tributação dos rendimentos do capital e da propriedade» e, entre outras medidas, procedeu à «criação de uma taxa especial para tributar prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor». Assim, no que respeita à tributação da propriedade, entendeu o legislador, com base no aludido «prin- cípio da equidade social na austeridade», ser de exigir uma contribuição acrescida aos titulares de bens imó- veis de elevado valor destinados a habitação. Daí que o facto a que atribuiu relevância enquanto elemento determinante da incidência desta nova «taxa especial» e enquanto manifestação da capacidade contributiva, tenha sido a propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos, com afetação habitacional, cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a € 1 000 000. Ou seja, o legislador entendeu que a disponibilidade, fundada na titularidade de um direito de propriedade, de usufruto ou de superfície, de uma unidade habitacional deste valor (a calcular com base no valor patrimonial que é tido em conta para efeitos de IMI), constitui um elemento revelador de uma capacidade contributiva acrescida em relação aos demais contribuintes, apta a justificar esta tributação especial, destinada a garantir a referida «repartição dos sacri- fícios necessários ao cumprimento do programa de ajustamento» feita por todos e não apenas por aqueles que vivem do rendimento do seu trabalho. Selecionou-se, pois, como realidade tributável a titularidade de uma unidade predial habitacional com um valor superior a € 1 000 000, resultando esse valor daquele que é calculado para efeitos de cobrança de IMI. Ora, se num prédio constituído em propriedade horizontal, essa titularidade só pode reportar-se a cada uma das frações autónomas, pois cada uma das diferentes frações pode ser objeto de uma situação jurídica real própria, o mesmo não sucede num prédio em que, apesar de dividido fisicamente em unidades suscetí- veis de utilização independente, a sua titularidade reporta-se necessariamente ao todo correspondente à soma das diferentes unidades, não podendo os direitos reais referidos na verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo ter por objeto isolado uma dessas unidades. Assim, para efeitos do imposto aqui sob fiscalização, enquanto o valor de todo um prédio que não se encontra constituído em propriedade horizontal, apesar de ser composto por diferentes unidades suscetíveis de terem uma utilização independente, revela a capacidade contributiva do seu único titular, já o mesmo não sucede com um prédio idêntico constituído em propriedade horizontal, uma vez que, sendo cada uma das frações suscetíveis de uma situação jurídica real própria, só o valor de cada uma delas é idóneo a revelar a capacidade contributiva do seu titular.
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