TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

526 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 2010 (artigos 187.º, n.º 1, e 188.º da Lei n.º 98/2009). E ao fazê-lo introduziu uma diferença no tratamento dos sinistrados em função da data de ocorrência do acidente de trabalho: para acidentes de trabalho ocor- ridos antes de 1 de janeiro de 2010 continuam a valer os limites legais aplicáveis; para acidentes ocorridos depois desta data, vale a regra da revisão a todo o tempo. Mas esta diferenciação tem fundamento razoável, porquanto existem razões de segurança jurídica a acautelar. Com efeito, a solução de aplicar o regime de 2009 a todos os acidentes de trabalho, independen- temente da data em que os mesmos tenham ocorrido, conduziria necessariamente à possibilidade de fazer renascer situações passadas e definitivamente consolidadas na ordem jurídica, colocando em causa o referido princípio da segurança jurídica. De facto, admitir esse “renascimento” apenas porque o legislador, na sua liberdade de conformação, decidiu legislar de forma diferente para o futuro, é algo que afeta intoleravelmente a segurança das relações jurídicas. É que, como o Tribunal tem recordado, também as expetativas do responsável pelo pagamento da pen- são merecem tutela: «O regime de reparação por acidentes de trabalho decorre da lei, mas a relação jurídica que conduz à reparação pelo acidente de trabalho por uma empresa seguradora resulta do contrato de seguro celebrado. É pela celebração deste negócio jurídico que a entidade empregadora transfere a sua responsabilidade para uma seguradora, acor- dando ambas as partes as condições e termos da efetivação pela última de uma prestação ao trabalhador sinistrado, caso se verifique a condição de que depende a cobertura. Como contrapartida, a entidade empregadora obriga-se a pagar o prémio de seguro igualmente acordado. Ora, para a estipulação do valor deste prémio concorre natural- mente a apreciação do risco seguro e este é necessariamente condicionado pelo regime legal em vigor. […] Assim, a ponderação entre o princípio da igualdade e o princípio da segurança jurídica, em situação de con- fronto entre si resultante da alteração de regimes jurídicos, deve ser feita pelas normas instrumentais de conflitos, nomeadamente as normas transitórias. É neste âmbito que, visando precisamente garantir a segurança nas relações jurídicas entre sinistrado e entidade responsável pelo pagamento da pensão, a norma constante do artigo 187.º, n.º 1 da Lei n.º 98/2009, veio estabelecer que o novo regime de revisão das pensões só vigora para os acidentes ocorridos após a publicação da lei que eliminou o limite de prazo para o efeito» (Acórdão n.º 136/14) Atenta, na verdade, contra o princípio da segurança que a seguradora seja confrontada com a realização dum exame de revisão da incapacidade, quando se trata dum acidente de trabalho com incapacidade perma- nente já fixada e que, face ao regime legal então aplicável, acarretou a extinção do direito de requerer tal revisão. 9. Nos presentes autos, o Ministério Público defende nas suas alegações uma posição contrária à juris- prudência deste Tribunal favorável à conformidade constitucional da fixação de limites legais temporais – em especial, o prazo de dez anos – para o exercício do direito à revisão da incapacidade, quando não se tenha registado qualquer evolução justificadora de pedido de revisão nesse período (Acórdãos n. os 155/03, 612/08, 411/11, 219/12, 111/14, 136/14, 205/14 e 583/14); e, estando em causa um prazo de cinco anos, invoca um argumento de maioria de razão. Porém, e desde logo, não se acompanha a aludida posição contrária à jurisprudência constitucional em causa pelas razões e méritos em que a mesma assenta. Depois, é preciso não perder de vista que a norma recusada aplicar pela decisão ora recorrida se limita a concretizar o direito à justa reparação, hoje consignado no artigo 59.º, n.º 1, alínea f ) , da Constituição. A mesma norma não só não impede a reparação integral da incapacidade causada pelo acidente de trabalho no momento em que é fixada a pensão definitiva por incapacidade, como acautela um período mínimo de cinco anos em que tal incapacidade pode ser objeto de reavaliação, tendo em conta eventuais agravamentos, permitindo desse modo ajustar o valor da pensão.

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