TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

542 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL “Na concretização deste domínio de «reserva de convenção coletiva», o Tribunal Constitucional já afir- mou a não inconstitucionalidade da subtração por lei ao domínio da contratação coletiva da matéria do pro- cedimento disciplinar (Acórdão n.º 94/92); da matéria das prestações complementares de segurança social (Acórdão n.º 517/98, citado); do regime da cessação do contrato de trabalho (Acórdão n.º 581/95 e Acórdão n.º 391/04, citado); do método de cálculo da pensão de aposentação (Acórdão n.º 54/09); ou da eficácia temporal das convenções coletivas (Acórdão n.º 338/10). Em contrapartida, considerou que “a fixação das remunerações dos trabalhadores em regime de contrato individual de trabalho é um campo especialmente aberto à autonomia da vontade e, assim, à regulamentação coletiva”, concluindo pela inconstitucionalidade de uma norma dos Estatutos da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa que atribuía à respetiva Mesa o poder de fixar unilateralmente as remunerações dos trabalhadores daquela Misericórdia, subtraindo-as à negociação coletiva (Acórdão n.º 229/94) ”. 13.ª – No caso concreto, sabe-se que a atribuição destas regalias previstas em IRCT relativas ao transporte gra- tuito resultam de uma negociação com os trabalhadores que terá tido como contrapartida para as empresas evitar o aumento de outros custos do trabalho, nomeadamente do salário. 14.ª – Por isso, em bom rigor, estas regalias não são, sequer, um custo para as empresas mas sim um benefício que permitiu uma redução efetiva dos custos do trabalho. 15.ª – Sendo que, a sua eliminação altera de forma grave os pressupostos da negociação coletiva, ou mesmo, em alguns casos, individual. 16.ª – O que acontece de forma discriminatória por se aplicar a uma determinada categoria de trabalhadores, excluindo-se outros em iguais circunstâncias, doutros modos de transporte. 17.ª – A recorrida sendo uma empresa do sector empresarial do Estado, em que o seu capital é detido inte- gralmente pelo Estado, através do seu poder tutelar teve a possibilidade de negociar ou de influenciar a negociação (veja-se a este propósito o douto acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09.10.2002, onde se reconhece o domínio e controlo do Estado sobre a empresa pública aqui recorrida e outras criadas posteriormente), vindo agora, unilateralmente, anular o negociado, sem a despectiva compensação, usando para isso o seu poder legislativo. 18.ª – Na verdade, o Estado assume o papel de negociador no âmbito do seu poder tutelar e, simultaneamente, chama a si, através do seu poder legislativo, o poder de anular o benefício que dessa negociação resultou para a outra parte. 19.ª – O Estado constrói legislativamente uma norma que obriga as empresas que tutela e sobre as quais detém todo o capital social a incumprir o negociado e contratado com os trabalhadores, através das suas estruturas coleti- vas, sem qualquer compensação, ferindo os direitos e as mais que legitimas expectativas dos trabalhadores. 20.ª – O que, além do mais, constitui uma ingerência na gestão da empresa da recorrida, sem que para tanto subsista qualquer justificação ou critério minimamente aceitável, sendo de realçar, embora sobre questão diferente, o que se deixou dito no acórdão do Tribunal de Justiça (1.ª seção) de 25 de outubro de 2012, onde, nos pontos 39 e 40 se lê o seguinte: “39 Acrescente-se que, ao subordinar qualquer decisão individual de aquisição ou de alienação de partici- pações no capital de sociedades à aprovação do Governo, a legislação portuguesa sujeitou a CP a um controlo externo de natureza política, que de modo nenhum corresponde às modalidades e aos meios de ação e de controlo de que dispõem os acionistas de uma sociedade de ações de direito privado. 40 Consequentemente, há que concluir que o Estado português conservou um papel determinante nos processos decisórios internos das empresas ferroviárias, que não é compatível com a liberdade reconhecida à empresa de transporte ferroviário de tomar decisões relativas aos ativos por ela geridos.” 21.ª – As concessões de viagem constituem um direito atribuído diretamente ao trabalhador, sendo que a possibilidade dos seus familiares se fazerem transportar gratuitamente é uma decorrência do direito do trabalhador inscrito na sua esfera jurídica ao nível do seu contrato de trabalho. Nem outra coisa faria sentido na medida em

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