TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

560 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ao momento da libertação”. [ Direito Criminal – III (1), lições em colaboração com Anabela Miranda Rodrigues e António M. de Almeida Costa, Coimbra, 1980, p. 127]. Ora, a comunidade prisional pressupõe um regime disciplinar próprio, com finalidades específicas, visando, relativamente a cada um dos reclusos, assegurar o preen- chimento de uma finalidade recuperadora, prévia à plena reinserção social do recluso, recuperação que se alcança fundamentalmente pela prestação de trabalho e integral inserção na vida comunitária prisional.» Especificamente no que diz respeito ao Direito Disciplinar, o Tribunal Constitucional, no mesmo Acór- dão, também referiu que «A Constituição estabelece, em matéria de processo disciplinar a propósito do regime da função pública, a garantia de audiência e defesa ao arguido (artigo 269.º, n.º 3). Esta norma constitucional é um afloramento de um princípio geral do direito disciplinar público, aplicável aos sujeitos que se encontrem em outras relações especiais com os entes públicos (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição cit., pp. 947-948)» (cfr. Acórdão n.º 263/94, n.º 9). Também o Direito Penitenciário – domínio em que se integra o direito sancionatório que rege a execução da sanção criminal traduzida numa pena ou numa medida de segurança privativa de liberdade – é autónomo em relação ao Direito Penal e ao Direito Processual Penal. Na imagem de Anabela Rodrigues, «Do que se trata, se quisermos, é de “províncias” de um mesmo ordenamento jurídico – o ordenamento jurídico-penal. Mas de províncias diferenciadas (…)» (Anabela Miranda Rodrigues, Novo Olhar Sobre a Questão Penitenciária, Coimbra Editora, 2002, p. 22). A este respeito, a autora fala-nos de uma «“autonomia integradora” que faz ressaltar a “unidade” em que converge o direito penitenciário, enquanto instrumento de política criminal, com o direito penal e o direito processual penal» o que significa «vincular o direito penitenciário aos princípios gerais do direito e processo penal, designadamente ao princípio da legalidade. Mas, simultaneamente, desenvolver e densificar princípios que lhe são próprios, como é o caso do princípio da socialização» ( ob. cit. , p. 23). 13. Existe, com efeito, uma especificidade, desde logo qualitativa, da teleologia que preside à pena cri- minal, orientada que é para a proteção de bens jurídicos de relevância comunitária e em defesa da sociedade, sendo distintos os fins prosseguidos pelas sanções disciplinares em geral, e em especial, pela medida discipli- nar aplicada ao recluso vocacionada para preservar a ordem e a disciplina do estabelecimento e os fins da exe- cução da medida privativa de liberdade. Relevante será recordar que as medidas sancionatórias de natureza disciplinar vão desde a repreensão escrita ao internamento em cela disciplinar até 21 dias (artigo 105.º do CEPMPL) e são aplicadas pelo diretor do estabelecimento. No caso de se tratar de medida de confinamento ao alojamento ou internamento em cela disciplinar, existe sempre possibilidade de impugnação perante o tribunal de execução de penas (artigo 114.º do CEPMPL). Esta impugnação tem efeito suspensivo. Marcantes são também as diferenças que separam o processo penal de qualquer outro regime sancio- natório, em geral, e em especial, do processo disciplinar aplicado a reclusos, ainda que em cumprimento de pena aplicada num processo daquele primeiro tipo. Também neste campo – o processual – a Constituição distingue o domínio penal dos demais, especificando, no artigo 32.º, as garantias que deve assegurar o processo criminal e sendo a partir desta identificação especificada para o processo criminal que têm sido irradiadas algumas daquelas garantias também para outros domínios sancionatórios. Encontramos exemplo claro dessa irradiação no n.º 10 daquele artigo 32.º, acrescentado pela revisão constitucional de 1989, numa explicitação da solução já antes sufragada em boa parte da doutrina e jurisprudência. Por último, não é possível estabelecer nenhuma identidade entre as restrições ao direito à liberdade previstas nos artigos 27.º e 28.º da Constituição e a sujeição a medidas cautelares na pendência de processo disciplinar instaurado a recluso. Desde logo, porque estas últimas incidem sobre sujeitos que se encontram já em situação de privação da liberdade concretizadora de uma das exceções ao princípio da liberdade cons- titucionalmente previstas. É que a situação de recluso se caracteriza precisamente pela detenção de todos os direitos inerentes à sua condição de cidadão, exceto – evidentemente – a liberdade. São, portanto, diferentes os fins prosseguidos pelas medidas de coação aplicadas no processo penal e as medidas cautelares aplicáveis no âmbito de um processo disciplinar, designadamente instaurado contra

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