TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015
583 acórdão n.º 680/15 Note-se que, encontrando-nos ainda perante o despacho liminar a que se refere o artigo 774.º, o despacho que admita o recurso, nesta fase, não garante desde logo a revisão da sentença impugnada, mas, tão só, a oportunidade de realização de exames ao sangue sendo que, caso os mesmos se venham a mostrar inconclusivos ou confirmem a paternidade, o recurso de revisão, aí sim, será julgado necessariamente improcedente; apenas no caso de o resultado de tal exames excluir claramente a paternidade do autor, aí sim, se imporá a procedência do recurso, com a conse- quente quebra do caso julgado e anulação da sentença revidenda, dando início à abertura da instrução na ação de impugnação [art. 776.º, n.º 1, al. c) do CPC]. Pelo exposto, entende-se que o recurso de revisão em apreço tem cabimento no âmbito do fundamento previsto na al. b) , do artigo 771.º do CPC, não tendo de ser instruído com a prova da falsidade dos depoimentos em que o tribunal se baseou para declarar a paternidade, prova esta que poderá ser produzida na fase rescindente do recurso, precisamente mediante a realização dos exames requeridos pelo Apelante. 2. Caducidade do direito de interpor recurso de revisão O recurso extraordinário de revisão interpõe-se de decisões transitadas em julgado, e só pode ser interposto se não tiverem decorrido mais de cinco anos do respetivo trânsito – n.º 2 do artigo 772.º do CPC –, tendo por função reparar anomalias processuais de especial gravidade, taxativamente enunciadas no artigo 771.º do CPC. Tendo a sentença revidenda sido proferida em 26.06.90, levanta-se a questão da caducidade do direito de inter- por recurso de revisão, por há muito ter decorrido o referido prazo de cinco anos sobre o seu trânsito em julgado. Invoca o Apelante a inconstitucionalidade do n.º 2 do artigo 772.º do CPC, quando interpretado no sentido de que já não pode ser interposto recurso de revisão de sentença proferida em processo de investigação de pater- nidade, por violação do disposto nos artigos 18.º, n.º 3, 26.º, n.º 1 e 36.º, n.º 1, da Constituição, defendendo a imprescritibilidade pura e simples, de tal direito. Com a previsão de tal recurso extraordinário, por via do qual se admite a reabertura de um processo extinto, abre a lei exceções ao caso julgado, razão pela qual se compreende que o mesmo se encontre sujeito a apertados limites, quer quando aos seus fundamentos, quer quanto ao prazo durante o qual pode ser deduzido. Para uma correta ponderação dos interesses em jogo, atenderemos aos juízos de valor que vem sendo formu- lados pelo Tribunal constitucional nas inúmeras decisões são em que teve de colocar na balança os dois grandes interesses aqui em confronto: por um lado, a certeza e a segurança jurídica – a recomendar a fixação de prazos para revisão – e, do outro lado, o respeito pela justiça material e, em especial, pela verdade biológica – a apontar no sentido do apuramento desta sem limites temporais. Como o tribunal constitucional tem vindo a salientar, para avaliar se a limitação temporal – imposição de um prazo de caducidade de cinco anos para a interposição do recurso de revisão – é adequada, necessária e proporcional ao conteúdo dos interesses ou valores em confronto, “não pode prescindir-se de encarar a situação concreta que originou o caso julgado”. No Acórdão n.º 209/04 [7], [7 Disponível in http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20040209.html .] citado pelo Apelante, o tribunal constitucional apreciou e concluiu pela inconstitucionalidade do prazo de cinco anos previsto no n.º 2 do n.º 2 do artigo 772.º do CPC, restringindo-se, embora, tal declaração ao recurso de revi- são de uma sentença proferida numa ação oficiosa de paternidade, cujo fundamento era a falta ou nulidade da cita- ção. Aí se entendeu que a solução normativa consagrada na citada norma, quando aplicável aos casos em que, tendo ocorrido à revelia a ação em que foi proferida a decisão cuja decisão é requerida, seja alegada como fundamento da revisão, precisamente, a falta ou a nulidade da citação para aquela ação, é efetivamente inconstitucional, por ofensa do princípio do contraditório, em que se integra a proibição da indefesa contida no artigo 20.º da Constituição. Contudo, apesar de se encontrar em discussão o mesmo prazo de caducidade de interposição do recurso de revisão, reportado, em ambos os casos, a uma ação de investigação de paternidade, a diversidade do fundamento aqui invocado para o recurso de revisão – existência de meios científicos que hoje garantem a verdade biológica – levará a que o princípio fundamental afetado seja, não já o princípio do contraditório, mas sim o direito à identidade pessoal e o direito ao desenvolvimento da personalidade (um direito de conformação da própria vida, um direito geral de liberdade de ação cujas restrições tem de ser constitucionalmente justificadas, necessárias e
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