TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

585 acórdão n.º 680/15 ao autor demonstrar que houve relações de sexo entre a mãe e o pretenso pai no período legal de conceção do filho e que tais relações foram exclusivas [11]. [11 Cfr., neste sentido, Carlos Lopes do Rego, “O ónus da prova nas acções de investigação de paternidade: prova direta e indireta do vínculo da filiação”, in Comemorações dos 35 Anos do Código Civil e dos 25 anos da Reforma de 1997 , Vol. I, “Direito da Família e das Sucessões”, Coimbra Editora, p. 781]. A situação em apreço inseriu-se precisamente nesta última hipótese: a paternidade foi reconhecida unicamente pela demonstração no processo de que as relações de sexo que a autora manteve com o réu podiam ser a causa ade- quada da gravidez e do subsequente nascimento e de que a mãe do menor apenas as manteve com o aí réu, sendo a partir destes dois factos que as máximas da experiência apontaram o réu como o autor da fecundação. Com o presente recurso, pretende o autor, não só, por em causa o referido facto indiciário da exclusividade das relações com o réu no período legal da conceção, atestado em audiência de julgamento pelos depoimentos da mãe e das referidas testemunhas, como ainda, e essencialmente, efetuar prova direta de que não é ele o pai. A redação introduzida pelo DL 496/77, de 25 de novembro, ao artigo 1801.º do CC, ao consagrar expressa- mente a realização de exames científicos, veio privilegiar o princípio da verdade biológica, cientificamente compro- vada e que faça coincidir o estatuto de filho com a realidade do correspondente vínculo de derivação biológica[12]. [12 Como refere José da Costa Pimenta, a ideia mestra da Reforma de 1977 foi, sem dúvida, a abertura à verdade biológica. Se os laços jurídicos não corresponderem a laços sanguíneos, deve poder-se declarar-se isso, e investigar- -se, sem entraves, no sentido de estabelecer a correspondência, dando como exemplo do maior peso que vem sendo dado à verdade biológica, o alargamento das possibilidades de afastamento da presunção derivada do casamento ( pater is est ) – “Filiação”, Coimbra Editora, 1986, pags. 21 e 22.] Ora, se à data em que foi proferida a sentença a rever era ainda esporádico o recurso à realização de exames de sangue para o estabelecimento da paternidade, constituindo então um meio de prova pouco seguro, servindo as mais das vezes unicamente para efeitos de exclusão da paternidade[13] [13 Como é expressamente reconhecido por José da Costa Pimenta, na citada obra, pp. 43 e 44.], no atual estado da ciência os exames de ADN (ou DNA) propiciam um elevado grau de segurança (com probabilidades bioestatísticas superiores a 99,5%), constituindo a forma mais fiável de estabelecimento do vínculo biológico[14]. [14 Como se refere no citado Acórdão do STJ de 09.04.2013, nos últimos anos, foram descobertas técnicas, pelos cientistas, James Watson, americano e Francis Crik, Inglês, que utilizam o DNA como marcador da individualidade biológica, que têm tornado possível excluir ou admitir a paternidade, em 100% dos casos.] E se existem atualmente meios que conseguem diretamente demostrar o fenómeno biológico da procriação, atra- vés de prova científica concludente, que permita considerar demonstrada, com o grau de certeza pratica e socialmente exigível, a procriação biológica, parece-nos que a descoberta da verdade biológica se deve sobrepor à necessidade de segurança que está por detrás da fixação do prazo de cinco anos para a propositura do recurso de revisão. Com efeito, se apesar da declaração de paternidade efetuada em tal processo, e decorridos cerca de 18 anos, o declarado pai continua convencido de que não o é, o facto de se lhe conceder a possibilidade de proceder a exames de sangue, que com um grau de probabilidade próximo da certeza, lhe dirá se ele é, efetivamente, ou não, o pai biológico, contribuirá para uma pacificação de todos os interessados: se o teste confirmar que ele é o pai, o recurso de revisão será julgado improcedente; se o teste excluir a sua paternidade, confirmando a profunda convicção do autor, então, ter-se-á por justificada a reabertura do processo de investigação de paternidade, a fim de se fazer coin- cidir a verdade registral com a verdade biológica. Assim sendo, perguntamos nós, qual o interesse, para os envolvidos, em manter um estado de coisas em que, encontrando-se estabelecido no registo que determinado individuo é pai de outro, continuando aquele convicto de que o não é, tal reconhecimento jurídico acaba por não tem qualquer correspondência na relação interpessoal entre ambos? (eventuais interesses patrimoniais do filho na manutenção de tal situação não são por nós considerados dignos de tutela, ou pelo menos, não deverão prevalecer). Note-se, que, no caso em apreço, citado o declarado filho (que entretanto atingiu a menoridade), na sequência do recurso interposto do despacho de indeferimento liminar do recurso de revisão para os termos do recurso e da causa, o mesmo nem sequer deduziu oposição ao requerido, tendo-se remetido ao silêncio.

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