TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015
595 acórdão n.º 680/15 Com o presente recurso, pretende o autor, não só, por em causa o referido facto indiciário da exclusividade das relações com o réu no período legal da conceção, atestado em audiência de julgamento pelos depoimentos da mãe e das referidas testemunhas, como ainda, e essencialmente, efetuar prova direta de que não é ele o pai. A redação introduzida pelo DL. 496/77, de 25 de novembro, ao artigo 1801.º, do CC, ao consagrar expres- samente a realização de exames científicos, veio privilegiar o princípio da verdade biológica, cientificamente comprovada e que, faça coincidir o estatuto de filho com a realidade do correspondente vínculo de derivação biológica. Ora, se à data em que foi proferida a sentença a rever era ainda esporádico o recurso à realização de exa- mes de sangue para o estabelecimento da paternidade, constituindo então um meio de prova pouco seguro, servindo as mais das vezes unicamente para efeitos de exclusão da paternidade, no atual estado da ciência os exames de ADN (ou DNA) propiciam um elevado grau de segurança (com probabilidades bioestatísticas supe- riores a 99,5,), constituindo a forma mais fiável de estabelecimento do vínculo biológico. E se existem atualmente meios que conseguem diretamente demonstrar o fenómeno biológico da pro- criação, através de prova científica concludente, que permita considerar demonstrada, com grau de certeza pratica e socialmente exigível, a procriação biológica, parece-nos que a descoberta da verdade biológica se deve sobrepor à necessidade de segurança que está por detrás da fixação do prazo de cinco anos para a propositura do recurso de revisão. Com efeito, se apesar da declaração de paternidade efetuada em tal processo, e decorridos cerca de 18 anos, o declarado pai continua convencido de que não o é, o facto de se lhe conceder a possibilidade de proceder a exames de sangue, que com um grau de probabilidade próximo da certeza, lhe dirá se ele é, efetivamente, ou não, o pai biológico, contribuirá para uma pacificação de todos os interessados: se o teste confirmar que ele é o pai, o recurso de revisão será julgado improcedente; se o teste excluir a sua paternidade, confirmando a profunda convicção do autor, então, ter-se-á por justificada a reabertura do processo de investigação de pater- nidade, a fim de se fazer coincidir a verdade registral com a verdade biológica. Assim sendo, perguntamos nós, qual o interesse, para os envolvidos, em manter um estado de coisas em que, encontrando-se estabelecido no registo que determinado indivíduo é pai de outro, continuando aquele convicto de que o não é, tal reconhecimento jurídico acaba por não ter qualquer correspondência na relação interpessoal entre ambos? Note-se, que, no caso em apreço, citado o declarado filho (que entretanto atingiu a maioridade), na sequên- cia do recurso interposto do despacho de indeferimento liminar do recurso de revisão para os termos do recurso e da causa, o mesmo nem sequer deduziu oposição ao requerido, tendo-se remetido ao silêncio. Como se salienta no citado Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 23/2006, não podemos ignorar que “os exames biológicos conducentes à determinação da filiação, podem ser realizados fora dos processos judiciais, e a pedido dos particulares, sem qualquer limitação temporal, pelos próprios serviços do Instituto de Medicina Lega!”, pelo que aceitar, em termos absolutos, a limitação temporal dos cinco anos para a revisão das sentenças em que a paternidade haja sido declarada sem recurso a exames científicos, pode levar a situações melindrosas de existência de uma paternidade reconhecida no registo que se saiba não corresponder à verdade biológica por a mesma ter sido excluída por exames de sangue. A tal respeito, afirma-se ainda no Acórdão deste Tribunal de 31.10.2006, a propósito de um recurso de revi- são que teve como fundamento um exame sanguíneo realizado ao menor, à mãe e ao pretenso pai pelo IML, que excluía a paternidade do menor: “Se é do interesse da menor e da sociedade em geral que ela tenha um nome no lugar destinado ao pai no seu assento de nascimento, não é menos certo que tal nome deve corresponder ao do seu verdadeiro pai biológico. Outro nome que não esse falseia a realidade”. Como é salientado pelo Acórdão do Plenário do Tribunal Constitucional n.º 401/2001, a constituição e a determinação integral do vínculo da filiação, abrangendo ambos os progenitores, corresponde a um interesse geral de ordem pública, a um relevante princípio de organização jurídico-social. Dar eficácia jurídica ao vínculo gené- tico da filiação, propiciando a localização perfeita do individuo na zona nuclear mais do sistema das relações de
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