TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015
642 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL (circunstância que, todavia, não impediria este Tribunal de operar a convolação para a alínea/pressuposto adequado). De todo o modo, a ilegalidade a que se refere a alínea f ) , à semelhança do que ocorre com a alínea c) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, deve ser entendida com um sentido específico de relação entre atos legis- lativos de diferente valor, circunstância que o Tribunal vem realçando – cfr., inter alia, a Decisão Sumária n.º 306/09, disponível na página web do Tribunal Constitucional, www.tribunalconstitucional.pt / : «[…] [P]ressupõe uma relação de parametricidade entre uma norma de um ato legislativo de valor reforçado e uma norma de um ato legislativo de valor ordinário ou comum. A competência do Tribunal Constitucional para apre- ciar da ilegalidade, em sentido próprio, apenas abrange tal contradição entre normas de ato legislativo, de distinto valor hierárquico. […]». Ora, nos termos do n.º 3 do artigo 112.º da CRP, têm valor reforçado, além das leis orgânicas, as leis que carecem de aprovação por maioria de dois terços, bem como aquelas que, por força da Constituição, sejam pressuposto normativo necessário de outras leis ou que por outras devam ser respeitadas. Não é o caso de qualquer dos Diplomas aqui chamados à colação pelo recorrente. A Lei-Quadro da Política Criminal (Lei n.º 17/2006, de 23 de maio) foi aprovada nos termos da alínea c) do artigo 161.º da CRP, não estando, pois, sujeita à aprovação por maioria qualificada de dois terços. Não se trata de lei orgânica, já que nesses termos a não prevê a Constituição. Por outro lado, tratando-se de lei que visa enquadrar as leis sobre política criminal, cujas propostas são apresentadas pelo Governo à Assembleia da República (cfr. o seu artigo 7.º), não configura, todavia, pressuposto normativo necessário de outras leis ou que por outras leis deva ser respeitada – e sublinha-se a asserção que se segue – por força da Constituição, como ocorre, por exemplo, com a lei de enquadramento orçamental (artigo 106.º, n.º 2, da CRP), com a lei-quadro das privatizações (artigo 293.º da CRP), com as leis de adaptação do sistema fiscal às especificida- des regionais [artigo 227.º, alínea i), da CRP], com as leis-quadro das regiões administrativas (artigos 255.º e 256.º da CRP), com as leis das grandes opções dos planos face aos planos nacionais (artigo 91.º da CRP), com a lei das finanças regionais [artigo 227.º, alínea j), da CRP] e com a lei das finanças locais (artigos 165.º e 238.º, n.º 2, da CRP) (cfr. Gomes Canotilho, Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. II, 4.ª edição, Coimbra, 2010, p. 56-57). Pois bem, só o valor reforçado de uma lei que for resultante de previsão constitucional pode gerar a ile- galidade a que se referem os artigos 280.º, n.º 2, alíneas a) e d), da CRP e 70.º, n.º 1, alíneas c) e f ), da LTC. Como, a este respeito, salientam Jorge Miranda e Rui Medeiros ( Constituição Portuguesa Anotada, Tomo II, Coimbra, 2006, p. 271): «[…] Na medida em que a força específica de uma lei de valor reforçado decorre de normas constitucionais, a sua infração envolve inconstitucionalidade. Mas trata-se de inconstitucionalidade indireta – tal como a contradição entre lei interna e tratado ou entre regulamento e lei. Quer dizer: a lei contrária a lei de valor reforçado vem a ser inconstitucional, não porque ofenda uma norma constitucional de fundo, de competência ou de forma, mas por- que agride uma norma interposta constitucionalmente garantida. E, precisamente, o critério para se reconhecer se uma lei é reforçada ou não está em saber se se verifica ou não tal ocorrência; está em saber se a inconstitucionalidade surge imediatamente ou se é consequência da ilegalidade. E é esse o critério adotado pela Constituição, ao distinguir, nos artigos 280.º, 281.º e 282.º, inconstitucionalidade e ilegalidade. […]».
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