TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

645 acórdão n.º 684/15 p. 707, e Código de Processo Penal anotado pelos Magistrados do Ministério Público do Distrito Judicial do Porto, Coimbra, 2009, p. 685). As normas que dispõem sobre os momentos legalmente vinculados da constituição como arguido são as dos artigos 57.º a 59.º do CPP. Aliás, respondendo às mesmas preocupações que presidiram à alteração do artigo 272.º, a Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, alterou também a alínea a) do n.º 1 do artigo 58.º do CPP, de forma que, onde se previa que “[é] obrigatória a constituição de arguido logo que, correndo inquérito contra pessoa determinada, esta prestar declarações perante qualquer autoridade judiciária ou órgão de polí- cia criminal”, passou a prever-se que “[é] obrigatória a constituição de arguido logo que, correndo inquérito contra pessoa determinada em relação à qual haja suspeita fundada da prática de crime, esta prestar declara- ções perante qualquer autoridade judiciária ou órgão de polícia criminal” (sublinhado ausente no original). Do exposto retiramos, pois, um diferente posicionamento, na dinâmica processual penal, quanto à constituição dos suspeitos como arguidos, do artigo 272.º do CPP, por um lado, e dos artigos 57.º a 59.º do mesmo diploma, por outro. Daquele primeiro – assumindo sempre a presença de fundadas suspeitas – resulta que o ato em causa é obrigatório na fase de inquérito; dos demais resultam os específicos momentos, ao longo do processo, em que aquela obrigatoriedade também se materializa. Esta cisão está clara e perfeitamente presente na decisão recorrida, como resulta do excerto acima trans- crito, ao referir em primeiro lugar o disposto no artigo 272.º do CPP, para depois se centrar nos artigos 57.º a 59.º do mesmo Diploma. Só a propósito destes se refere a margem de discricionariedade (e nunca o mero “arbítrio”, como sugere o recorrente, extravasando de qualquer afirmação do tribunal a quo) do Ministério Público na definição do momento da constituição como arguido: “[f ]undamental é que a constituição de arguido obedeça à já acima referida lógica nuclear de chamada a juízo de alguém contra quem se mostram reunidos pressupostos que a colocam numa posição que demanda pelo menos a possibilidade do exercício de defesa, de acordo com as previsões identificadas nos artigos 57.º a 59.º do CPP, sendo que a definição desse momento se enquadra nos poderes de discricionariedade técnica pertencentes ao titular do inqué- rito ” (ênfase acrescentado). Assim, não foi o artigo 272.º do CPP que constituiu a ratio decidendi da verificação de conformidade do ato de constituição do recorrente como arguido, quanto ao momento em que ocorreu, mas sim os artigos 57.º a 59.º, mais concretamente o artigo 58.º. Isto porque, a existir de um modo relevante (o que não é o caso, como se verá), a questão colocada não se reconduziria ao artigo 272.º do CPP, mas sim ao artigo 58.º do mesmo diploma, na medida em que este não prevê, como momento obrigatório de constituição do sus- peito como arguido, para além dos ali elencados, o da simples verificação de suspeitas fundadas. Para além de não se tratar de uma norma (mas de uma ausência de norma), certo é que não se trata daquela que – na sua voluntária delimitação temática do recurso – o recorrente indicou no respetivo requerimento. O exposto (em suma, a desconformidade entre a norma da questão suscitada e a que constituiu a ratio decidendi da decisão que se pretende afastar) bastaria – recuperando as considerações iniciais que supra se teceram quanto às condições a que deve obedecer o recurso de inconstitucionalidade ( item 2.1., supra ) – para não conhecer o objeto do recurso, quanto à suscitação aqui em causa. 2.2.2.1. Acresce, todavia – uma vez mais reiterando tais considerações iniciais – que tal questão não apresenta a imprescindível dimensão normativa, essencial ao conhecimento de um recurso de constitucio- nalidade. Na verdade, a sua apreciação, reconduzindo-se apenas às incidências do caso concreto, remeteria o Tribunal para o conhecimento de questões de interpretação e aplicação da lei infraconstitucional (designa- damente, quanto ao conceito de “fundadas suspeitas” e a sua verificação ou incidência no caso concreto) e, acima de tudo, não permitiria que a decisão se circunscrevesse à interpretação de uma norma com potencia- lidade de generalização a outros casos. Ora – e na linha do sentido geral do recurso de inconstitucionalidade, já traçado em 2.1., supra –, a necessária dimensão normativa do recurso de constitucionalidade, mesmo no “alargamento” a uma concreta dimensão interpretativa de uma norma (que este Tribunal, como dissemos,

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=