TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015
65 acórdão n.º 538/15 O âmbito da atividade farmacêutica consta da base XXI da Lei de Bases da Saúde, que nela inclui «a produção, comercialização, importação e exportação de medicamentos e produtos medicamentosos», acres- centando que a legislação especial que venha a ser editada «deve garantir a defesa e a proteção da saúde, a satisfação das necessidades da população e a racionalização do consumo de medicamentos» e, finalmente, que a atividade farmacêutica integra ainda a matéria relativa à «instalação de equipamentos produtores de estabelecimentos distribuidores de medicamentos e produtos medicamentosos e o seu funcionamento». Esta disciplina de princípio viria a ser densificada pelo Decreto-Lei n.º 176/2006, que se assume como um decreto-lei de desenvolvimento, emitido ao abrigo do artigo 198.º, n.º 1, alínea c) , da CRP, explicitando o respetivo preâmbulo que se pretende «regulamentar a base XXI da Lei de Bases da Saúde». 11. Traçado este quadro, pode desde logo questionar-se se a matéria da publicidade dos medicamentos – campo temático com imediata conexão à atividade dos DIM, visto que, por razões de saúde pública, a atividade publicitária está altamente dependente de ações levadas a cabo junto dos profissionais de saúde – integra as bases gerais da atividade farmacêutica, tal como esta surge delimitada na Lei de Bases da Saúde. As dúvidas adensam-se em virtude da circunstância – não decisiva, mas ainda assim pertinente – de o diploma legislativo que anteriormente disciplinava a publicidade dos medicamentos de uso humano – o Decreto-Lei n.º 100/94 – não ter sido emitido ao abrigo do artigo 198.º, n.º 1, alínea c) , da CRP, sem que a sua constitucionalidade tenha sido, por esse motivo, objeto de impugnação na jurisdição constitucional. Contudo, mesmo admitindo que a publicidade integra a atividade farmacêutica e que, na sua densifi- cação, o Governo está adstrito a um conteúdo de natureza paramétrica – aquele que consta da Lei de Bases da Saúde – e a uma determinada forma – a de decreto-lei de desenvolvimento –, nada disso demonstra a impossibilidade de o regime jurídico do acesso dos DIM aos estabelecimentos do SNS poder ser estabelecido através de ato regulamentar. Com efeito, não pode retirar-se da repartição de tarefas instituída por uma lei de bases uma qualquer proposição quanto à neutralização do poder regulamentar do Governo. Ora, o Governo não se furtou a disciplinar, através do Decreto-Lei n.º 176/2006, a publicidade do medicamento de uso humano, fixando uma série de regras jurídicas precisas e densas sobre o modo como essa publicidade deve ser efetuada junto do público e dos profissionais de saúde; as obrigações a que estão sujeitos os laboratórios e os DIM no processo de visita às instalações do SNS; as situações em que essa publicidade pode ser levada a cabo mediante ações de formação, congressos científicos ou amostras gratuitas; e a entidade a quem incumbe supervisionar a atividade publicitária no setor do medicamento (cfr. artigos 150.º a 165.º do Decreto-Lei n.º 176/2006). O mesmo é dizer que o desenvolvimento, pelo Governo, da disciplina jurídica da atividade publicitária relativa ao medicamento – ou seja, o complemento dos princípios, diretrizes e critérios constantes da Lei de Bases da Saúde sobre esta matéria – ocorreu por via de um ato legislativo. Deste modo, e atento o facto de que a reserva se restringe às bases, nada impede que o tratamento da concreta conformação do acesso dos DIM às instalações do SNS se faça por via regulamentar. Estão em causa aspetos meramente secundários da atividade publicitária presencial ( v. g. , a periodicidade, o modo e o local em que as visitas devem ocorrer), que, em face do grau de concretização reclamado e do melhor posicionamento do decisor administrativo, não cabem na chamada “reserva de decreto-lei de desenvolvimento”. Tanto basta para que se conclua que o artigo 157.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 176/2006, não viola o artigo 198.º, n.º 1, alínea c) , da CRP, na parte em que deste decorre que o desenvolvimento das bases gerais dos regimes jurídicos instituídos pelo legislador parlamentar deve operar-se através de decreto-lei de desen- volvimento do Governo e não de regulamento administrativo. 12. Considera ainda a Requerente que o artigo 157.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 176/2006, ao remeter a disciplina do regime de acesso dos DIM às instalações do SNS para despacho ministerial, viola o disposto em vários preceitos constitucionais, entre eles o artigo 112.º, n.º 6, estando, por conseguinte, ferido de um vício orgânico ou de competência.
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