TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015
654 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL convicção, que o determinou, de que qualquer outra das medidas de coação é inadequada e insuficiente. Quando assim é, fica patente aos olhos de todos, sem margem para qualquer dúvida, que estamos perante uma decisão pessoal do juiz, cujo conteúdo é da sua responsabilidade e não ‘preformatado’ pelo requerimento do Ministério Público. Como se deixou escrito no Acórdão n.º 189/99 (acessível e m www.tribunalconstitucional.pt ): «(…) É óbvio que o despacho, que melhor espelha a responsabilização pessoal do juiz pela ordem de prisão que dá, é aquele em que o juiz enuncia, ele próprio, os motivos de facto da decisão tomada, em vez de se remeter para as razões invocadas pelo Ministério Público». Mas a circunstância da fundamentação da decisão que coloca um arguido em prisão preventiva, proferida por um juiz, remeter para anterior promoção do Ministério Público, não permite, só por si, retirar a conclusão que ela não traduz uma opção livre, autónoma e independente do seu subscritor, uma vez que o quadro em que é feita a remissão pode revelar que a decisão tomada não deixou de ser o resultado duma ponderação própria. A adoção de tal técnica na exposição dos motivos que fundamentam a escolha dessa medida de coação pode significar que o seu autor considerou boas as razões que o Ministério Público invocou para fundamentar a sua proposta de decisão, pelo que as acolheu e fez suas, não tendo visto necessidade de recorrer a outras linhas de fundamentação ou de as expor em redação própria. […] Só em concreto se poderá avaliar se a decisão proferida, neste ou em qualquer outro processo, pelo Juiz de Ins- trução Criminal é suscetível de originar dúvidas sobre se a mesma transmite um juízo autónomo e pessoal do seu subscritor ou representa um simples «’ir atrás’ do Ministério Público» (Acórdão n.º 189/99). E esse é um juízo que cabe exclusivamente às instâncias, não tendo o Tribunal Constitucional competência para o formular. Quanto à observância do dever de fundamentação, o artigo 205.º da Constituição impõe que as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente devam ser fundamentadas na forma prevista na lei. Como é consabido e tem sido referido em variados arestos deste Tribunal, o cumprimento do dever de funda- mentação das decisões judiciais pode assumir, conforme os casos, uma certa geometria variável, sendo entregue ao legislador ordinário a tarefa de definir as formas e o grau de fundamentação exigível. Relativamente às medidas de coação [da aplicação destas se tratou neste Acórdão n.º 391/15], com exceção do termo de identidade e residência, o artigo 194.º, n.º 6, do Código de Processo Penal, exige que a fundamentação do despacho que as aplique contenha, sob pena de nulidade: ‘ a) A descrição dos factos concretamente imputados ao arguido, incluindo, sempre que forem conhecidas, as circunstâncias de tempo, lugar e modo; b) A enunciação dos elementos do processo que indiciam os factos imputados, sempre que a sua comunicação não puser gravemente em causa a investigação, impossibilitar a descoberta da verdade ou criar perigo para a vida, a integridade física ou psíquica ou a liberdade dos participantes processuais ou das vítimas do crime; c) A qualificação jurídica dos factos imputados; d) A referência aos factos concretos que preenchem os pressupostos de aplicação da medida, incluindo os previstos nos artigos 193.º e 204.º’. Constitucionalmente é exigível que na fundamentação seja visível uma racionalização dos motivos da decisão, revelando-se aos sujeitos processuais e à comunidade o conhecimento das razões que subjazem ao concreto juízo decisório, devendo, para isso, a fundamentação revelar uma aptidão comunicativa na exteriorização das premissas que presidem à sua conclusão, assim como o respetivo juízo de valoração, de modo a transmitir, como condição de inteligibilidade, a intrínseca validade substancial do decidido. E numa decisão como a que decreta a prisão preventiva de uma pessoa, dado estar em causa a aplicação de uma medida que restringe de uma forma particularmente intensa o direito à liberdade do detido, a necessidade de observância daqueles requisitos faz-se sentir de uma forma mais intensa. Contudo, tais exigências não ficam materialmente prejudicadas quando uma decisão que decrete a prisão preventiva, perante uma pronúncia anterior fundamentada sobre a questão a decidir emitida por um dos interve- nientes processuais, designadamente o Ministério Público, remeta para as razões aí invocadas, subscrevendo um juízo que se considera totalmente adequado. Na verdade, nada impede que o resultado de uma avaliação crítica
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