TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015
66 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Contudo, a qualificação do vício operada pela Requerente não é, de novo, a mais correta. Tendo iden- tificado como objeto de controlo o n.º 5 do artigo 157.º − leia-se, a própria norma habilitante –, a eventual desconformidade deste normativo com o preceituado no n.º 6 do artigo 112.º da Constituição só pode configurar-se como um vício material ou de conteúdo, gerador de inconstitucionalidade material e não de inconstitucionalidade orgânica (cfr. Jorge Miranda, ob. cit. , p. 223). Aquele preceito constitucional – recorde-se – assinala que os regulamentos independentes do Governo devem assumir a forma de decreto regulamentar. Como a doutrina e a jurisprudência evidenciam, pretendeu o legislador constituinte, através desta exigência, garantir a intervenção do Primeiro-Ministro e do Presidente da República no procedimento de elaboração dos regulamentos independentes [cfr. artigos 134.º, alínea b) , e 201.º, n.º 3, da CRP], ou seja, evitar que o Governo lançasse mão do instrumento regulamentar, em alter- nativa ao exercício do seu poder legislativo, como forma de se furtar aos requisitos e controlos específicos da produção legislativa (cfr. o Acórdão n.º 56/95 e, na doutrina, os ensinamentos de Gomes Canotilho/Vital Moreira, ob. cit. , Volume II, p. 71, e de Sérvulo Correia, Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos, reimpressão, Almedina, 2013, p. 228). A procedência da questão de constitucionalidade levantada pela Requerente depende, portanto, de poder configurar-se como um regulamento independente o regulamento a cuja emissão o artigo 157.º, n.º 5, habilita. Ora, o conteúdo da norma habilitante não aponta na direção de um regulamento independente, no sentido que a jurisprudência constitucional vem atribuindo ao conceito (cfr. os Acórdãos n. os 289/04, 620/07 e 75/10). De facto, o artigo 157.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 176/2006 não se limita a definir a competência sub- jetiva e objetiva para a emissão do regulamento, antes estabelecendo algumas diretrizes, ainda que genéricas, relativas ao conteúdo e sentido da normação a instituir, concretamente: (i) determinando que os DIM não gozam de um direito geral de acesso a serviços públicos, antes se prevendo que os entes públicos do SNS possam, em determinadas condições, consentir nesse acesso; e (ii) estipulando que o regime de acesso a ins- tituir por regulamento deve conter regras e mecanismos que permitam assegurar o normal funcionamento dos serviços e a transparência da atividade profissional dos DIM. Em conclusão, encontrando o regulamento no diploma habilitante alguns princípios, diretrizes e crité- rios que predeterminam minimamente o sentido e o conteúdo da normação a produzir, tudo aponta no sen- tido de aí se prever, não um regulamento independente, mas um regulamento de execução, estando afastada a hipotética violação do artigo 112.º, n.º 6, da CRP. Nestas condições, a norma constante do artigo 157.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 176/2006, não constituindo habilitação para a emanação de um regulamento independente, não é materialmente inconstitucional, não contendendo com o disposto no n.º 6 do artigo 112.º da Constituição. Naturalmente que, como se disse supra, tal não exclui a hipótese de o n.º 5 do artigo 157.º ofender o n.º 5 do mesmo artigo 112.º da CRP. Tal sucederia, caso a norma legal que habilita o regulamento conferisse ao órgão competente para o editar os poderes de «com eficácia externa, interpretar, integrar, modificar, sus- pender ou revogar, qualquer dos preceitos da lei». Tal não é, manifestamente o caso, limitando-se a norma legal a atribuir competência ao «membro do Governo responsável pela área da saúde» para, por despacho – forma regulamentar legítima para os regula- mentos de execução – determinar os «mecanismos e as regras que permitam assegurar o normal funciona- mento dos serviços e a transparência da atividade profissional dos delegados.» 13. No que ao despacho regulamentar especificamente respeita, poderiam colocar-se três questões, a saber: a) Trata-se, efetivamente, de um regulamento de execução? b) Sofre de alguma inconstitucionalidade material? c) Sendo um regulamento de execução, respeita a norma habilitante?
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