TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

102 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL no quadro de um Estado de direito é a de compensar o titular do interesse sacrificado, repondo a igualdade com os demais titulares de interesses particulares semelhantes […]». Deve, assim, considerar-se que o perito tem direito a ser compensado pelo sacrifício que lhe é imposto na sua atividade de colaboração com os tribunais da República Portuguesa, direito esse que lhe é legalmente reconhecido pelo artigo 17.º do Regulamento das Custas Processuais e que decorre do direito geral à repa- ração ou compensação por danos provenientes de ações ou omissões lícitas do Estado, constitucionalmente fundado no princípio do Estado de direito democrático. 15. Feito este enquadramento, importa então apreciar da conformidade constitucional do limite máximo absoluto que é imposto à remuneração do perito. Deve começar por se referir que é possível identificar o interesse público que fundamenta a atuação do legislador ao introduzir este limite. Como referido no Acórdão n.º 656/14: «18. O motivo apresentado para a limitação referida passa pela necessidade de controlo das [custas] a ser pagas pelas partes litigantes, de forma a não restringir excessivamente o direito de acesso à justiça. Trata-se de uma preocupação constitucionalmente válida. De facto, a preocupação de evitar que as partes litigantes sejam oneradas com [custas] excessivamente elevadas, tendo em vista não frustrar o direito de acesso aos tribunais garantido no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição, encontra-se bem patente na jurisprudência do Tribunal Constitucional em matéria de custas. Como salientado no Acórdão n.º 467/91, ‘o asseguramento da garantia do acesso aos tribunais subentende uma programação racional e constitucionalmente adequada dos custos da justiça: o legislador não pode adotar soluções de tal modo onerosas que impeçam o cidadão médio de aceder à justiça’.» No entanto, apesar de o legislador ter «mandato constitucional para implementar medidas que pro- movam e garantam o acesso à justiça de todos os cidadãos (…) esse mandato não lhe confere legitimidade para o garantir à custa da imposição de um sacrifício excessivo aos agentes que colaboram na administração da justiça» (Acórdão n.º 656/14, ponto 20.). Efetivamente, «o Tribunal tem afirmado que a liberdade de conformação do legislador, designadamente em matéria de definição do montante de taxas integradoras das custas judiciais, ‘não implica que as normas definidoras dos critérios de cálculo sejam imunes a um controlo de constitucionalidade, quer no que toca à sua aferição segundo regras de proporcionalidade, decorrentes do princípio do Estado de direito (artigo 2.º da Constituição), quer no que respeita à sua apreciação à luz da tutela constitucional do direito de acesso à justiça (artigo 20.º da Constituição); em qualquer dos casos, sob cominação de inconstitucionalidade material (cfr. Acórdãos n. os 1182/96 ou 352/91) (…). E proferiu, mesmo, alguns julgamentos de inconstitucionalidade por violação combinada de ambos os princípios (por exemplo, nos Acórdãos n. os 1182/96 e 521/99’ (Acórdão n.º 227/07)» (Acórdão n.º 656/14, ponto 18.). Como refere o Acórdão n.º 16/15, ponto 7., in fine : «O dever de agir do legislador em vista da garantia da compensação dos sacrifícios legitimamente impostos em benefício do interesse público não prejudica que o mesmo goze de uma ampla liberdade de conformação. Por isso, não podem excluir-se soluções legais diferenciadas. Mas, por outro lado, cada uma das soluções estabelecidas pelo legislador não pode contrariar o sentido teleológico fundamental da compensação, ou seja, a satisfação de exigên- cias de justiça distributiva. Em especial, a compensação tem de ser proporcional ao sacrifício». Assim, embora se deva reconhecer uma margem de liberdade de conformação do legislador ao fixar a compensação devida aos peritos que colaboram com a Justiça, pelo seu sacrifício, é de concluir que essa mar- gem tem limites que são decorrentes da Constituição e que podem ser objeto de fiscalização pelo Tribunal Constitucional.

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