TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

106 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL medida legislativa. Mas trata-se de um regime cujo efeito mitigador é fortemente limitado pelo facto de esta- belecer um teto remuneratório inultrapassável de 10 unidades de conta; a partir de um certo nível, de resto baixo, de complexidade e/ou de duração, verifica-se uma desproporção crescente entre o sacrifício imposto ao perito e a contrapartida remuneratória que lhe pode ser atribuída. Ora, a questão que se coloca é a de saber se esta medida restritiva de direitos fundamentais, considerada no conjunto dos seus elementos compressores e mitigadores, viola o princípio da proibição do excesso (artigo 18.º, n.º 2). Sobre a sua legitimidade e a sua adequação não se podem suscitar quaisquer dúvidas. É ponto assente que a Constituição não proíbe que se imponham aos cidadãos deveres de colaboração na promoção de direitos fundamentais e outros interesses constitucionalmente protegidos e que a imposição aos peritos de um dever de colaborar na administração da justiça é um meio idóneo à promoção da qualidade dessa mesma justiça. As dúvidas surgem quando se considera se a medida é necessária, ou seja, se constitui o meio menos restritivo no conjunto dos meios idóneos à prossecução da sua finalidade. Admitindo-se que a fixação de um teto remuneratório na lei serve o propósito legítimo de controlar os custos do processo, não se vislumbra qualquer razão válida para que o limite, sendo absoluto, seja tão baixo que impeça uma compensação razoavelmente proporcional ao sacrifício imposto por peritagens complexas e/ou prolongadas. Um regime remuneratório mais flexível, seja por permitir que se ultrapasse o limite legal quando o serviço prestado pelo perito excecionalmente o justificar, seja por estabelecer um limite máximo fixado em valores mais elevados, mitigaria de forma expressiva o efeito restritivo da imposição legal do dever de colaboração dos peritos, sem prejudicar de forma alguma a qualidade da justiça que esta medida visa pro- mover e sem criar um risco sério de inflação descontrolada dos custos processuais. Por outro lado, é justo que o sacrifício seja, na medida possível, suportado não pelo próprio perito, mas pelo processo em cujo âmbito presta os seus serviços. Neste particular, o problema tem algumas afinidades com o da requisição e a expropriação por utilidade pública, admitidas pela Constituição desde que ao pro- prietário seja paga uma justa compensação destinada, quer a ressarci-lo do sacrifício imposto pela medida, quer a distribuir os seus custos pelos cidadãos (através do uso de dinheiros públicos) cujo interesse é por ela servido. E assim como a expropriação sem justa indemnização constitui uma violação ilícita do direito de propriedade (artigo 62.º, n.º 2), a colaboração imposta sem justa remuneração constitui uma restrição excessiva do direito ao livre desenvolvimento da personalidade e da liberdade de escolha de profissão (artigos 26.º, n.º 1, 47.º, n.º 1 e 18.º, n.º 2). É por força da limitação desnecessária (e por isso excessiva) do efeito mitigador da restrição da liberdade que a norma extraída dos n. os 2 e 4 do artigo 17.º (conjugados com a tabela IV) do Regulamento de Custas Processuais, segundo a qual a colaboração imposta aos peritos na administração da justiça é remunerado por um valor que não pode em caso algum exceder 10 unidades de conta, é inconstitucional. – Gonçalo de Almeida Ribeiro. Anotação: 1 – Acórdão publicado no Diário da República , I Série, de 8 de março de 2013. 2 – Os Acórdãos n. os 656/14 e 16/15 est ão publicados em Acórdãos, 91.º e 92.º Vols., respetivamente.

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