TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

108 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL III – No caso, os requerentes apenas impugnam a norma que identifica o Estado como detentor da quali- dade de concedente, e não já os poderes relativos aos poderes gerais do concedente, nem a ressalva do que se encontre previsto na lei e do que resulte dos contratos de concessão, não parecendo evidente, tendo em conta a delimitação do conteúdo proclamatório da norma, que dela possam ter resultado efeitos que devam ser necessariamente corrigidos ou eliminados; por outro lado, e caso tenham sido, durante o período de vigência da norma, produzidos efeitos que devam ser eliminados, sempre estará à disposição dos interessados a via da fiscalização concreta da constitucionalidade, mostrando-se, assim, desprovida de interesse relevante a apreciação do pedido formulado quanto à norma prevista no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 174/2014, devendo concluir-se pela verificação de inutilidade superveniente que obsta ao conhecimento do mérito do pedido, nessa parte. IV – Quanto à norma extraída do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 175/2014, de 5 de dezembro, que identi- fica o Estado como concedente da concessão de serviço público de transporte por metropolitano de passageiros na cidade de Lisboa e nos concelhos limítrofes da Grande Lisboa, abrangidos pela respeti- va área correspondente ao nível III da Nomenclatura das Unidades Territoriais para Fins Estatísticos (NUTS), ao Tribunal cabe decidir se o legislador viola a Constituição, quando se limita a identificar o Estado no papel de concedente na concessão acima mencionada. V – A questão de saber se o legislador podia, com a norma impugnada, identificar o Estado como conce- dente, nos moldes em que o fez, por Decreto-Lei não autorizado, obriga a saber se através da norma impugnada o Governo legisla sobre o estatuto das autarquias locais, que inclui, estando portanto sujeita à reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, a regulação das atri- buições das autarquias locais e das competências dos seus órgãos. VI – É manifesto que a norma impugnada não estatui sobre as atribuições e competências das autarquias locais em geral nem, em especial, sobre as atribuições do Município de Lisboa e as competências dos seus órgãos, pois o que ela faz é, simplesmente, identificar o Estado como concedente de um serviço público de transportes de passageiros e, implicitamente, como detentor das competências relativas à contratualização desse serviço público, dela não resultando a atribuição desse poder, que vem já pres- suposto; ora, só poderia falar-se em afetação do estatuto das autarquias locais, e, portanto, em violação da reserva de competência legislativa, se a norma estabelecesse a intervenção do Estado numa matéria que estivesse necessariamente ao cuidado dos órgãos daquela autarquia local, por estar abrangida pela garantia constitucional da autonomia local. VII – A matéria relativa ao serviço de transporte público coletivo de passageiros não é, sequer, matéria de exclusiva incidência local, por opção constitucional, pelo que não pode considerar-se necessariamente incluída no estatuto das autarquias locais, nada impedindo que, mediante decreto-lei não autorizado, o legislador previsse a mera identificação do Estado como concedente, de onde decorre que a norma impugnada – que não tem o alcance que os requerentes lhe atribuem –, não transgride a regra da reser- va relativa de competência legislativa da Assembleia da República, estabelecida na alínea q) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, não se verificando o pressuposto que daria efetividade de sentido à questão de inconstitucionalidade orgânica suscitada.

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