TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

112 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 13. A Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, publicada quatro dias mais tarde, atribuiu aliás expressamente às câmaras municipais a competência para “criar [...] e gerir [...] redes de [...] de transportes” – cfr. artigo 64.º, n.º 2, alínea f ) . 14. Tendo entrado em vigor no dia 18 de outubro de 1999 – cfr. artigo 102.º – é claro que, a partir daquela data, se deve ter por transferida de novo para a CML a posição jurídica de concedente no contrato celebrado em 1973 com a Carris, do mesmo passo que se deve entender que o Estado, na sua manifestação enquanto Admi- nistração Central, ficou impossibilitado de exercer competências ou atribuições na área dos transportes urbanos regulares de passageiros que se desenvolvessem exclusivamente na área do município, uma vez que transferiu tais competências, nos termos da Lei n.º 159/99, de 14 de setembro, para os municípios e que, evidentemente, a noção de transferência não acomoda qualquer coexistência de competências ou atribuições concorrentes entre a Administração Local e o Estado. 15. Em 2003, foi publicado o Decreto-Lei n.º 268/2003, de 28 de outubro, que estatuiu que, no caso, passava a ser competência dos órgãos executivos da Autoridade Metropolitana de Transportes de Lisboa (adiante “AMT Lx”), que criou, “Contratar, conceder ou autorizar [...] a exploração dos serviços de transportes regulares rodoviá- rios [...] de passageiros, nos termos das disposições legais e regulamentares aplicáveis.” – cfr. artigo 6.º, n.º 1, alínea j) . Este diploma, entretanto revogado pela Lei n.º 1/2009, de 5 de janeiro, foi alterado em 2004 pelo Decreto- -Lei n.º 232/2004, de 13 de dezembro, no seu artigo 4.º, n.º 1, dispôs que “Na prossecução das suas atribuições e competências, as AMT, E.P.E., assumem a posição contratual do Estado ou de outros entidades públicas, [...] em contratos [...] aceites por pessoas jurídicas privadas”, do mesmo passo que manteve inalterada a competência da AMT Lx antes constante do artigo 6.º, n.º 1, alínea j) , do texto original, agora renumerado para passar a ser o artigo 11.º, n.º 1, alínea j) . 16. Estes diplomas de 2003 e 2004 – mesmo tendo em conta que, nos termos do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 268/2003, de 28 de outubro, as atribuições e competências conferidas “à administração direta e autónoma” do Estado, entre elas as constantes do Decreto-Lei n.º 688/73, de 21 de dezembro, que aprovou as Bases da Con- cessão de transporte urbano de passageiros de superfície, eram transferidas para as Autoridades Metropolitanas de Transportes – não podem ter tido como efeito a alteração da realidade concessória vigente desde outubro de 1999, isto é, não podem ter alterado a posição jurídica ocupada pela CML como concedente no contrato celebrado em 1973 com a Carris. 17. É que, desde a revisão constitucional de 1982 – cfr. Lei Constitucional n.º 1/82, de 30 de setembro – que a matéria do estatuto das autarquias locais constitui matéria de reserva relativa de competência da Assembleia da República [clarificação introduzida com a alteração do texto da alínea h) do artigo 167.º da Constituição da Repú- blica, renumerada em 1982 em alínea r) do n.º 1 do artigo 168.º] e, assim, na ausência de autorização legislativa que permitisse ao Governo alterar por Decreto-Lei o regime fixado na Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, manti- nha-se nas esfera das atribuições municipais a matéria referente aos transportes urbanos regulares de passageiros. 18. A interpretação conforme com a Constituição dos diplomas de 2003 e 2004 só pode ser, portanto, que a AMT Lx não assumiu a posição de concedente no contrato de 1973. 19. Seja como for, a eventual inconstitucionalidade dos diplomas de 2003 e 2004 não tem hoje interesse prático, uma vez que estes foram revogados pela Lei n.º 1/2009, de 5 de janeiro, que estatuiu, no artigo 4.º, que as Autoridades Metropolitanas de Transportes “têm atribuições em matéria de [...] organização, operação [...] do transporte público de passageiros”, dispondo em consequência no artigo 27.º, que “A contratualização do serviço público de transporte de passageiros por parte das AMT rege-se por diploma próprio, pelas disposições aplicáveis de direito comunitário e, subsidiariamente, pelo regime das subvenções públicas.” Uma vez que, neste caso, se tratava de Lei da Assembleia da República, não se colocando portanto problemas de competência legislativa, a dis- posição do artigo 4.º teve por efeito retransferir ope legis para o Estado, no caso para a AMT Lx, a posição jurídica de concedente no contrato celebrado em 1973 com a Carris. Nem se diga que essa transferência dependeria da publicação do diploma referido no artigo 27.º da lei: é que a sua ausência não poderia ter efeito na relação contra- tual pré-existente desde 1973 com a Carris.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=