TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

122 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL trânsito, postes de iluminação, obras de arte, túneis, e todas as coisas singulares imprescindíveis (ou, pelo menos, úteis) ao desempenho da função pública determinante da dominialidade.” 99. Nos casos em que o Metro usa na concessão espaços nos passeios e noutras zonas do domínio público municipal, a conclusão a que se deve chegar é a mesma que foi alcançada para a Carris: o Metro carece de autori- zação do município ou de autorização legislativa que haverá de resultar de lei da Assembleia da República ou de decreto-lei autorizado (cfr. artigo 165.º, n.º 1, alínea v) , da Constituição da República Portuguesa), para utilizar, na execução da concessão, tais bens. 100. Na medida em que o artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 175/2014, de 5 de dezembro, estatui que é o Estado o concedente no contrato celebrado em 1973, inexiste, nos seus termos e por via contratual, a autorização do muni- cípio para o uso pelo Metro desses bens, resultando assim, em inconstitucionalidade que ora se suscita, por força de aquela norma dispor implicitamente, sem para tal ter o Governo sido autorizado pela Assembleia da República, sobre a utilização pelo concessionário do domínio público municipal. 101. O uso pelo subsolo pelo Metro requer uma nota adicional, que haverá de se ater à definição da sua natu- reza pública ou privada. A doutrina tem entendido que, se é certo que o subsolo não tem forçosamente que possuir a mesma natureza dominial da superfície, essa qualificação depende da afetação que lhe é dada. Como escreveram Afonso R. Queiró e José G. Queiró in “Propriedade pública e direitos reais de uso público do domínio da circu- lação urbana”: “ [...] assim, nos termos do artigo 1344.º/1 do Código Civil, a propriedade de imóveis abrange o espaço aéreo correspondente à superfície, bem como o subsolo [...]; mas, quando está em causa a fixação dos limites do domínio público, parece ser de aceitar que o caráter dominial ou público do direito de propriedade só se estende até onde o exigir a afetação dominial, podendo por conseguinte vigorar um regime de direito privado quanto às camadas sobre ou subjacentes ao solo do domínio público. [...] Os volumes sub e sobrejacentes às coisas dominiais só devem, portanto, considerar-se sujeitos ao regime de propriedade pública na estrita medida em que esse regime seja necessário à realização da correspondente afetação. Onde cessarem as exigências dessa afetação, aí cessam também os limites da propriedade pública.” 102. Ora, no caso do uso do subsolo utilizado pela rede do Metro, é manifesto o seu uso público, destinado que está à construção de uma rede de transportes públicos de passageiros, integrada numa concessão de serviço público atribuída àquela empresa, e é por isso manifesta a inclusão do subsolo em causa nos bens do domínio público municipal, convocando a mesma inconstitucionalidade já identificada a propósito da superfície (e do espaço aéreo onde foram instalados os viadutos e estações à superfície do Metro). 103. Também neste capítulo, uma nota deve ser feita quanto ao alcance material do presente pedido de fisca- lização abstrata da constitucionalidade. 104. Como acima se escreveu, parece que é possível interpretar as disposições normativas do Decreto-Lei n.º 175/2014, de 5 de dezembro, de forma que apenas se encontre ferido de inconstitucionalidade material e orgânica o artigo 8.º, porque é apenas nele que o Governo entendeu fixar que é o Estado o concedente no contrato celebrado em 1949 com o Metro. Declarada inconstitucional aquela norma – ou, até, apenas a parte da norma que se refere ao Estado como concedente e removida, portanto, a inconstitucionalidade, poderiam sobreviver sem vício as restantes normas. 105. Todavia, é inteiramente admissível a ideia de que todo o conteúdo do diploma em causa, porque se refere apenas à relação entre concedente e concessionária, assenta de forma indissociável na estatuição contida no artigo 8.º no que se refere à determinação da identidade do concedente e que, assim, a inconstitucionalidade detetada naquela regra afeta a totalidade do diploma e não apenas ela mesma. 106. É por essa razão, admitindo que deva ser essa a construção correta da economia do diploma em apreço, que os Deputados ora signatários também entendem dever suscitar a fiscalização abstrata da constitucionalidade do Decreto-Lei n.º 75/2014, de 5 de dezembro, por inteiro, para que dúvidas não subsistam.

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