TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

140 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL dessas qualidades, se encontrem refletidos noutras normas, não parecendo, tendo em conta a deli- mitação do conteúdo proclamatório da norma, que dela possam ter resultado efeitos que devam ser necessariamente corrigidos ou eliminados, tanto mais que, por força do Decreto-Lei n.º 86-D/2016, de 30 de dezembro, o legislador pretendeu resolver a questão; por outro lado, e caso tenham sido, durante o período de vigência da norma, produzidos efeitos que devam ser eliminados, sempre estará à disposição dos interessados a via da fiscalização concreta da constitucionalidade, mostrando-se des- provida de interesse relevante a apreciação do pedido formulado quanto à norma prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 5.º do RJSPTP, no segmento referente à Companhia Carris de Ferro de Lisboa, S. A., devendo concluir-se pela verificação de inutilidade superveniente que obsta ao conhecimento do mérito do pedido, nessa parte. IV – Já no que respeita ao conhecimento dos segmentos da norma que permanecem inalterados, nada obsta ao seu conhecimento, sendo estes perfeitamente autonomizáveis do segmento excluído pela alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 86-D/2016, de 30 de dezembro, e considerando-se que o novo inciso, agora incluído na parte final, não alterou os sentidos normativos que o requerente pretende ver questionados. V – Para a análise de constitucionalidade a empreender é absolutamente determinante ter presente que não nos encontramos perante matérias com exclusiva incidência local; a jurisprudência do Tribunal tem reconhecido que existem domínios, entre os quais os da «promoção habitacional, do ordena- mento do território, urbanismo e gestão do ambiente» que não podem pertencer em exclusivo às autarquias locais, uma vez que incidem sobre matérias que têm que ser prosseguidas em conexão com o interesse nacional, pelo que devem estar abertas à intervenção concorrente das autarquias locais e do Estado; esta jurisprudência é totalmente transponível para o domínio dos transportes terrestres e fluviais de passageiros que, tal como os domínios da promoção habitacional, do orde- namento do território, urbanismo e ambiente, transcende o universo dos interesses específicos das comunidades locais, pois incide sobre matérias que têm conexão com interesses supralocais, interes- ses gerais da coletividade, por cuja satisfação o Estado, nos termos constitucionais, é (ou também é) responsável, o que lhe outorga título legitimador bastante para uma intervenção conjugada com a das autarquias locais, mesmo no plano da realização de tarefas administrativas, a um nível infraes- tadual. VI – Também nesta área, não pode inferir-se da garantia institucional da autonomia local a consagração de uma reserva constitucional de competência dos entes autárquicos, de acordo com um modelo de rígi- da separação entre esferas de interesses e de atribuições, como se fosse identificável (e eficientemente operativa) uma clara e intransponível linha de demarcação entre o que é e não é de relevo local; pelo contrário, nestas matérias, o modelo é o da interdependência de competências e de ação protagoniza- da, em comum, pelas entidades públicas a quem, em conjunto, cabe satisfazer necessidades básicas da população objeto de direitos fundamentais, sendo essa articulação que, desde há muito, o legislador tem procurado estabelecer, reconhecendo a necessidade de coordenação de políticas nacionais e locais no domínio dos transportes terrestres e fluviais de passageiros dos grandes aglomerados urbanos, em especial de Lisboa e Porto, e das respetivas áreas metropolitanas, assim como tem reconhecido a estrei- ta ligação entre os sistemas de transportes de passageiros, o ordenamento do território, o urbanismo e o ambiente.

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