TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

145 acórdão n.º 40/17 regime que vigorara entre 1940 e 1975, ainda que, naturalmente, no quadro constitucional resultante da Consti- tuição da República Portuguesa de 1976 e do reforço e autonomia do Poder local que dela resulta. 24 – Do mesmo passo se deve entender que o Estado, na sua manifestação enquanto Administração Central, ficou impossibilitado de exercer competências ou atribuições na área do transporte urbano regular de passageiros que se desenvolvesse exclusivamente na área de um município ou que fosse intermunicipais, uma vez que a lei transferiu tais competências para os municípios e que, evidentemente, a noção de transferência não acomoda qualquer coexistência de competências ou atribuições concorrentes entre a Administração Local e o Estado, como aliás adiante melhor se demonstrará. 25 – Em 2003, foi publicado o Decreto-Lei n.º 268/2003, de 28 de outubro, que estatuiu que passava a ser competência dos órgãos executivos das Autoridades Metropolitanas de Transportes de Lisboa e do Porto (adiante “AMT LX” e “AMT Prt”), que criou, “Contratar, conceder ou autorizar [...] a exploração dos serviços de transpor- tes regulares rodoviários [...] de passageiros, nos termos das disposições legais e regulamentares aplicáveis” 33 . Este diploma, entretanto revogado pela Lei n.º 1/2009, de 5 de janeiro, foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 232/2004, de 13 de dezembro, que dispôs que “Na prossecução das suas atribuições e competências, as AMT, E. P. E., assumem a posição contratual do Estado ou de outras entidades públicas, [..,] em contratos [...] aceites por pessoas jurídicas privadas” 34 , do mesmo passo que manteve inalterada a competência das AMT Lx e AMT Prt, antes constante do artigo 6.º, n.º 1, alínea j) , do texto original, agora renumerado para passar a ser o artigo 11.º, n.º 1, alínea j) . 26 – Estes diplomas de 2003 e 2004 – mesmo tendo em conta que, nos termos do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 268/2003, de 28 de outubro, as atribuições e competências conferidas “à administração direta e autónoma” do Estado eram transferidas para as Autoridades Metropolitanas de Transportes, uma forma de administração indireta do Estado – não podem ter tido como efeito a alteração das atribuições e competências autárquicas vigente desde outubro de 1999. 27 – É que, desde ao menos a revisão constitucional de 1982 35 , a matéria do estatuto das autarquias locais constitui matéria de reserva relativa de competência da Assembleia da República, clarificação introduzida com a alteração do texto da alínea h) do artigo 167.º, da Constituição da República, renumerada em 1982 em alínea r) do n.º 1 do artigo 168.º 28 – Assim, na ausência de autorização legislativa que permitisse ao Governo alterar por decreto-lei o regime fixado na Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, manteve-se na esfera das atribuições municipais, e não na das Auto- ridades Metropolitanas de Transportes, a matéria referente ao transporte urbano de passageiros. 29 – Seja como for, a eventual inconstitucionalidade dos diplomas de 2003 e 2004 não tem hoje interesse prático, uma vez que estes foram revogados pela Lei n.º 1/2009, de 5 de janeiro, que estatuiu que as Autorida- des Metropolitanas de Transportes têm “atribuições em matéria de [...] organização, operação [...] do transporte público de passageiros” 36 , dispondo em consequência que “A contratualização do serviço público de transporte de passageiros por parte das AMT rege-se por diploma próprio, pelas disposições aplicáveis de direito comunitário e, subsidiariamente, pelo regime das subvenções públicas” 37 . Uma vez que, neste caso, se tratava de Lei da Assembleia da República, não se colocando portanto problemas de competência legislativa, a disposição do artigo 4.º teve por efeito retransferir para o Estado, no caso para a AMT Lx e para a AMT Prt, as atribuições em questão neste pedido de fiscalização de constitucionalidade. 30 – Em 2013, porém, a Assembleia da República voltou a alterar a matéria das atribuições em questões de transporte urbano de passageiros. Com efeito, a Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, que entrou em vigor no dia 30 de setembro de 2013, estatuiu que os municípios dispõem de atribuições em matéria de “transportes” 38 e que “compete à câmara municipal [...] gerir serviços [e] redes de [...] transportes” 39 . Como se salientou supra, a Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, manteve expressamente em vigor as transferências de atribuições resultantes já da Lei n.º 159/99, de 14 de setembro, nomeadamente em matéria de transportes. 31 – Assim sendo, é forçoso concluir que o diploma de 2013 teve por efeito a retransmissão das atribuições em causa neste pedido de declaração de inconstitucionalidade de novo para os municípios, sem distinção, desta vez, entre os municípios de Lisboa e do Porto e os do resto do país.

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