TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

172 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL (…) 24. Como é referido pela doutrina é matéria de importância fundamental para a determinação dos limites da autonomia político-administrativa das Regiões o seu financiamento (Miranda, Jorge e Medeiros, Rui, in Consti- tuição da República Portuguesa anotada , Tomo III, p. 325,Coimbra Editora, 2007). Consideram esses autores que apesar da Constituição ter traçado para o financiamento das Regiões Autónomas um desenho de “regionalismo cooperativo” isso não significa que “não haja espaço para uma leitura que privilegie as receitas próprias das Regiões – objeto de normas concretizadoras” (como os citados preceitos da LFRA) em detrimento das que lhes são pro- porcionadas pelas transferências estaduais. Deve ser entendido que o núcleo estruturante da capacidade financeira das Regiões Autónomas está nas receitas que sejam consideradas próprias, assim definidas de forma garantística constituindo o âmago da autonomia financeira constitucionalmente consagrada. 25. O Tribunal Constitucional tradicionalmente tinha uma orientação que reputamos importante nesta maté- ria. Na vasta jurisprudência constitucional publicada sobre o relacionamento financeiro entre os denominados subsetores da administração pública financeira, tem persistido a ideia de que a Constituição garante um conjunto de receitas próprias a cada um deles, núcleo essencial intocável pela legislação ordinária. 26. No fundo, a Constituição assegura a autonomia financeira das Regiões com um grupo fundamental de receitas, cuja fonte principal são as receitas fiscais nelas cobradas e geradas. Esse valor é o que permite às Regiões perspetivar as suas despesas com estabilidade e segurança. Há assim um núcleo de receitas próprias que constitui um princípio constitucional do poder de dispor de receitas próprias e que sustentam o financiamento das Regiões Autónomas não podendo ser alterado ou violado pela legislação ordinária. 27. Como se escreveu no Acórdão deste Tribunal n.º 567/04, de 23 de novembro de 2004, é necessário asse- gurar que as Regiões continuem a dispor do poder orçamental que lhes é atribuído, não ficando impedidas nem de tomar autonomamente as decisões de afetação das receitas às suas despesas [cfr. o artigo 227.º, n.º 1, alínea j) , da Constituição], ou seja, de decidir quais as finalidades das despesas, quais os serviços que recebem os créditos orçamentais e o seu volume, nem de definir autonomamente as suas fontes de receitas próprias. 28. O mesmo se aplica, em princípio, também aos impostos extraordinários liquidados como adicionais ou sobre a matéria coletável ou a coleta de outros impostos constituem receita da circunscrição a que tenham sido afetados os impostos principais sobre que incidiram sendo proporcionalmente afetados a cada circunscrição e podendo de acordo com o diploma que os criar, ser afetados exclusivamente a uma ou mais circunscrições se a situação excecional que os legitima ocorrer ou se verificar apenas nessa ou nessas circunscrições. (artigo 32.º da LFRA). 29. Como resulta da leitura do preceito, a lei admite excecionalmente que possam ser afetados de forma diferente da que resulta da territorialidade do fator gerador de imposto, quer na sua existência (impostos apenas vigorando numa determinada circunscrição) quer na afetação da receita resultante. 30. Só excecionalmente, como é referido no Acórdão n.º 11/83 (melhor precisado no seu conteúdo pelos Acórdãos 66/84 e 141/85), se admite que “as disposições constitucionais não podem deixar de ser interpretadas no sentido de consentirem o lançamento de impostos de caráter extraordinário cujo produto reverta inteiramente para o Estado, quando ocorram circunstâncias excecionais, nomeadamente de crise económico-financeira, que justifi- quem esse comportamento legislativo”, já que “o legislador constitucional, ao estabelecer os princípios constantes dos artigos atrás mencionados, teve basicamente presente um quadro de normalidade financeira e, consequente- mente, tão-só os impostos ordinários correntes, razão pela qual devem poder haver-se por excluídos daquele quadro os impostos extraordinários e não permanentes ditados por razões de manifesta excecionalidade”. A jurisprudência constitucional admite que a receita de impostos extraordinários possa ser afetada a um dos setores da administração financeira pública (com os precisos limites que o Acórdão n.º 141/85 veio referir) quando razões excecionais de necessidade financeira o determinem. Aliás no mesmo sentido do que hoje dispõe o artigo 32.º da LFRA, atrás transcrito, remetendo para a necessidade de ser criado um imposto extraordinário para acudir a circunstâncias excecionais de necessidades de financiamento.

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