TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

174 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL (…) 39. Resulta da jurisprudência interpretativa do princípio da autonomia financeira das Regiões Autónomas a necessidade de averiguar se, em relação à sobretaxa criada pela Lei n.º 159-D/2015 do final do ano passado, há justificação para que o seu produto seja afetado exclusivamente ao Orçamento do Estado. 40. No presente ano, o País já não está vinculado ao memorando de entendimento celebrado com as referidas três entidades e não está compelido a fazer cumprir as medidas extraordinárias de arrecadação de receita aí previs- tas. Acresce que, como é sabido o País deve sair no final de 2015, pela primeira vez, do procedimento de défice excessivo. Isso significa que as razões excecionais que fundamentaram a sobretaxa existente nos anos da Troika deixaram de existir. 41. Também devemos referir que não se descortinam razões que justifiquem o prolongamento por mais um ano (o quarto) de uma medida que era provisória e devia apenas vigorar no ano de 2012! 42. Na apresentação da iniciativa de projeto da Lei n.º 159-D/2015 isso mesmo é reconhecido, não se apre- sentando fundamentados argumentos da excecionalidade que justifiquem a sua existência, esclarecendo mesmo que 2015 foi o ano de conclusão do PAEF e que se prevê a saída do procedimento especial dos défices excessivos. 43. E é totalmente ausente qualquer justificação para a incidência ser todo o território nacional e para que toda a receita resultante daquela sobretaxa seja afeta exclusivamente ao Orçamento do Estado. 44. Acresce que, no caso concreto, as dificuldades financeiras da Região Autónoma da Madeira persistem e não tem sido possível aplicar no espaço regional as reduções das taxas que a LFRA admite ao nível dos impostos diretos e indiretos (artigo 59.º). Ou seja, tendo estado impedida a Região de compensar a insularidade pela via fiscal (com a redução das taxas de imposto determinadas a nível nacional) por causa do seu Programa de Assistência Econó- mica e Financeira (PAEF, em anexo) em vigor até ao final de 2015, vê-se agora impedida de contar com a receita resultante da sobretaxa cobrada aos sujeitos passivos residentes no seu território. 45. Responsabiliza-se assim os contribuintes residentes neste território e com uma dupla incidência: uma carga fiscal não reduzida nas suas taxas por causa da situação financeira regional e com uma contribuição extraordinária para o Orçamento do Estado! 46. Cremos assim que a não justificação nem o não preenchimento dos pressupostos de excecionalidade que justificam a afetação a uma só circunscrição territorial das receitas cobradas em todo território nacional de um determinado imposto extraordinário, afetando o princípio constitucional da titularidade da totalidade das receitas fiscais cobradas nos territórios regionais, constitui um argumento suficiente para considerar inconstitucional e ilegal o preceito em causa». 2. No âmbito do processo n.º 408/16, foi pedida pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, a apreciação e declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade e da ilegalidade da norma contida no artigo 3.º, n.º 14, da Lei n.º 159-D/2015, de 30 de dezembro, com fundamento na violação do disposto no artigo 227.º, n.º 1, alínea j) , da Constituição, e no artigo 112.º, n.º 1, alíneas a) e d) , do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira (EPARAM), respetivamente. É a seguinte a fundamentação do pedido: «De acordo com os preceitos constitucionais, os impostos gerados ou cobrados nos arquipélagos são pertença das Regiões Autónomas. Tal premissa está consagrada na alínea j) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição da República Portuguesa, a qual estipula que as regiões Autónomas têm o poder de “dispor, nos termos dos estatutos e da Lei de Finanças das Regiões Autónomas, das receitas fiscais nelas cobradas ou geradas, bem como de uma participação nas receitas tributárias do Estado, estabelecida de acordo com um princípio que assegure a efetiva solidariedade nacional, e de outras receitas que lhes sejam atribuídas e afetá-las às suas despesas”. Este direito é reconhecido e defendido, entre outros, pelos constitucionalistas Gomes Canotilho e Vital Moreira, que, na Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. II (4.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2006 p. 675), reiteram que “as Regiões Autónomas têm direito a dispor de todas as receitas fiscais cobradas no

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=