TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

184 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL culturais dos arquipélagos dos Açores e da Madeira e nas históricas aspirações autonomistas das populações insulares, que tem por finalidade a participação democrática dos cidadãos, o desenvolvimento económico- -social, a promoção e defesa dos interesses regionais e o reforço da unidade nacional e dos laços de solida- riedade entre todos os portugueses e como limite a não afetação da integridade da soberania do Estado e do respeito do quadro constitucional (cfr. artigo 225.º da Constituição e Acórdão n.º 258/07) – não exclui, na dimensão fiscal em que se encontra concretizada [cfr. alínea j) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição], a possibilidade de lançamento de tributos que revertam exclusivamente a favor do Orçamento do Estado. Conforme se afirmou no Acórdão n.º 252/14, a dimensão fiscal da autonomia político-administrativa das regiões autónomas, tal como definida na alínea j) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição, não «coloca sob reserva regional simultaneamente indisponível e irrestringível todas e quaisquer receitas fiscais cobradas ou geradas na região», nem veda por consequência «ao legislador nacional a possibilidade de reverter para o Orçamento do Estado receitas provenientes de impostos lançados a título extraordinário e temporário, ainda que destinados» – e nessa medida constitucionalmente legitimáveis − «a fazer face a uma situação de emergência financeira nacional». Sob tal enquadramento, tudo estará, pois, em saber se é possível continuar a reconhecer na sobretaxa aplicável aos rendimentos sujeitos a IRS auferidos em 2016 os elementos necessários à sua classificação como um imposto extraordinário – e, por via disso, a mantê-la situada fora do âmbito de aplicação da alínea j) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição – ou, pelo contrário, se, perante a alteração da estrutura do imposto, o seu acumulado período de vigência e/ou a evolução da conjuntura económico-financeira subjacente à sua introdução, terão decaído os pressupostos imprescindíveis à subsistência daquela classificação e, por via disso, à possibilidade de reversão a favor do Orçamento do Estado da receita a esse título cobrada nos arquipélagos. Numa outra formulação, menos dependente de uma contraposição categorial entre impostos extraordi- nários e impostos ordinários, tratar-se-á em qualquer caso de averiguar se a integral alocação ao Orçamento do Estado da receita cobrada a título de sobretaxa pode constituir ainda, perante as referidas variáveis, um momento de justificado desvio ao princípio do relacionamento entre a República e as regiões autónomas em matéria de recolha e gestão de impostos ou, pelo contrário, não é já possível atribuir ao “interesse de todos os cidadãos” que com aquela alocação se prossegue uma relevância suficientemente justificativa da extensão em que, na sua dimensão fiscal, a autonomia político-administrativa das regiões autónomas poderá persistir afetada pela sucessiva replicação do regime previsto para aquele tributo em matéria de titularidade da receita cobrada. 13. Conforme se viu, o imposto em questão no caso sub juditio consiste numa «sobretaxa aplicável em sede de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS)» (cfr. artigo 1.º da Lei n.º 159-D/2015). Não obstante associada a esta espécie de imposto, a sobretaxa aplicável aos rendimentos sujeitos a IRS auferidos em 2016 continua a apresentar, do ponto de vista da sua estrutura interna, «elementos dissonantes das regras gerais do IRS» (cfr. Acórdão n.º 187/13) na medida em que é, por um lado, sujeita a um regime próprio de retenção na fonte (cfr. o n.º 8 do artigo 3.º da Lei n.º 159-D/2015), e tem, por outro, deduções à coleta próprias (cfr. artigo 3.º, n.º 2). Todavia, ao contrário das sobretaxas aplicadas aos rendimentos auferidos nos anos de 2011 e 2013 a 2015, a sobretaxa prevista para 2016 não dispõe, conforme se viu, de uma taxa fixa − mas antes um elemento de progressividade −, aproximando-se, neste ponto, do regime ordinário do IRS. Simplesmente, para além de não contender, em si mesma, com a possibilidade de manter a qualificação da sobretaxa como imposto extraordinário, a substituição da taxa fixa que vigorou nos anos precedentes por um modelo de taxa progressiva − e por isso variável − encontra direta justificação, conforme se verá, em razões relacionadas com a própria transitoriedade do imposto, medida a partir do regime previsto para a sua reversão, tal como estabelecido na própria Lei n.º 159-D/2015.

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