TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

228 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 2.2.2.2. De todo o modo, é patente que a norma enunciada – nos termos em que foi enunciada – não corresponde a qualquer sentido operante na decisão recorrida, contendo uma petição de princípio quanto ao ponto de chegada interpretativo pretendido excluir, metido forçadamente nas premissas de raciocínio. Importa recordar o que, sobre esta matéria, foi afirmado – efetivamente afirmado – no acórdão do Tribunal da Relação do Porto ora recorrido (fls. 1111/1114): “[…]  [No] caso em apreço, e não obstante todo o apoio concedido à recorrente, com o que se visava precisamente a recuperação e equilíbrio da sua família, com o consequente retorno dos menores à mesma, aquele apoio não surtiu efeito, donde este retorno não ser viável. E não se perspetivando retorno dos menores, a consequência seria a sua permanente institucionalização. Como escreve Tomé d’Almeida Ramião, ob. cit. , 69, “esta medida, de acordo com o princípio orientador de intervenção – prevalência da família biológica – deverá ser adotada sempre que esteja afastada a possibilidade de retorno da criança ou do jovem à sua família natural, para além da verificação concreta de alguma das situações referidas no artigo 1978.º do C. Civ., prevalecendo, sempre, o superior interesse da criança”. No mesmo sentido, escrevem Helena Bolieiro e Paulo Guerra, in “A Criança e a Família – Uma Questão de Direito(s)”, 72: “para os casos em que não existem vínculos afetivos próprios da filiação ou estes se encontram seria- mente comprometidos e se verifique uma das situações enunciadas no artigo 1978.º do Código Civil, o princípio da prevalência da família aponta para a implementação de medidas que promovam a adoção da criança”. Não se trata, por isso, de substituir a família da recorrente por outra, com mais competências para desenvol- vimento dos menores – o que poderia levar à conclusão de que as famílias com menos recursos ou com menos competências não pudessem criar os seus filhos. Mas de lhes dar uma família, que não têm. Nem virão a ter, caso tal dependa da recorrente, já que nada faz por isso. Família na qual se possam desenvolver de forma integral e har- moniosa, ou seja, nascer uma segunda vez: agora, como pessoas. Ora, resultou provado que a recorrente assume não poder acolher e prestar cuidados aos filhos, não preten- dendo, contudo, perder o contacto completo com os mesmos. Ou seja, acaba por colocar o seu próprio interesse – não perder por completo o contacto com os filhos, perfeita- mente compreensível – acima do superior interesse dos menores a terem uma família, na qual possam desenvolver relações de afeto de qualidade e significativas – que não têm, nem terão, atenta a postura da recorrente. Como se conclui no relatório social junto a fls. 300 e segs.: ‘As crianças carecem de uma atenção individualizada e de serem integradas num ambiente familiar securizante, protetor e reparador onde possa no seu crescimento, estabelecer relações de continuidade e qualidade, que despertam nela o sentimento de pertencer para sempre’. O que, no caso em apreço, não acontece, nem se vislumbra que venha a acontecer, como a própria recorrente assume: apenas não quer perder por completo o contacto com os filhos. E onde está o ambiente familiar deles, securizante, protetor e reparador, tão necessário ao seu desenvolvimento integral como pessoas? Em suma, manter a situação, sem nada fazer, era não atender ao superior interesse dos menores, e sim ao interesse da recorrente em manter os vínculos familiares, mas sem curar de lhes dar uma família. Com o que se mostram seriamente comprometidos os vínculos afetivos próprios da filiação – artigo 1978.º do C. Civil. Pelo que não se vislumbra a alegada inconstitucionalidade do artigo 1978.º do C. Civil, “interpretado no sentido de que mantendo-se o afeto entre mãe e filhos estes lhe serem retirados para a adoção só por a mãe não ter condições para cuidar deles convenientemente, por violar o artigo 36.º, n.º 6, da Constituição da República Portuguesa”. Já que, consoante acima se disse, se trata, antes, de dar aos menores, e atento o seu superior interesse, uma família, que não têm, nem a recorrente lhes dá ou dará: não por não ter condições, para o que existiria sempre apoio, mas porque não está disponível para tal, não obstante aquele apoio. […]” (itálico acrescentado).

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