TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

230 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Como tal, não se conhecerá do objeto do recurso relativamente à invocada inconstitucionalidade do artigo 1887.º-A do Código Civil. 3. Afastado o conhecimento do objeto do recurso quanto às questões relativas aos artigos 1978.º e 1887.º-A do Código Civil e 105.º, n.º 1, da LPCJP, resta-nos apreciar a invocada inconstitucionalidade: (a) do artigo 104.º da LPCJP, na interpretação segundo a qual o contraditório se mostra cumprido com a possi- bilidade de consulta dos autos sem necessidade de notificação prévia e pessoal dos documentos que serviram de prova aos factos da decisão que aplica uma medida de confiança com vista à futura adoção; e (b) do n.º 3 do artigo 88.º da LPCJP quando interpretado no sentido de os advogados dos pais não terem a faculdade de confiança e exame de todo o processo no seu gabinete em período de alegações de recurso. Tanto no pri- meiro como no segundo caso, as referências normativas correspondem às disposições que operaram como critério de decisão, no sentido em que constituíram a base legal sobre a qual foram construídas as asserções interpretativas correspondentes. Com efeito, quanto à primeira questão (artigo 104.º da LPCJP), o Tribunal da Relação do Porto, con- frontado nas alegações do respetivo recurso com uma invocação de desconformidade constitucional do artigo 104.º da LPCJP quanto à observância do princípio do contraditório face a determinadas condições de acesso da recorrente aos autos (cfr. a conclusão 9.ª do recurso transcrita no item 1.2., supra ), rejeitou esse enten- dimento, aceitando como constitucionalmente conforme, num quadro de efetiva garantia do contraditório – rectius , de um processo justo e equitativo no sentido do artigo 20.º, n.º 4, da CRP –, a não “[…] notifica- ção prévia e pessoal dos documentos […]”, posteriormente indicados como fonte de prova na decisão, em virtude de a recorrente ter usufruído da “[…] possibilidade de consultar os autos a fim de, uma vez inteirada do teor dos documentos juntos, exercer o contraditório, designadamente no debate judicial” (trecho final da transcrição da decisão recorrida no item 1.2.1., supra ). Estamos, pois, perante um determinado entendi- mento do que representa o exercício do contraditório no quadro traçado no artigo 104.º da LPCJP, represen- tando tal entendimento uma determinada construção interpretativa judicialmente referida a essa norma, ou seja – e é o que interessa no quadro da delimitação de uma questão de inconstitucionalidade normativa apta a ser apreciada pelo Tribunal Constitucional –, uma interpretação normativa: “[…] um juízo que o juiz há de retirar de uma norma (isto é, de um critério heterónomo de decisão) de que é apenas o mediador […]” (José Manuel Cardoso da Costa, “ Justiça Constitucional e Jurisdição Comum… ”, cit., p. 209, nota 12 da p. 208). E o mesmo sucede – a relevante suscitação de uma questão de inconstitucionalidade normativa – com a segunda questão a apreciar, relativa ao artigo 88.º, n.º 3, da LPCJP. Tratou-se aqui de entender, conferindo um determinado sentido interpretativo ao referido artigo 88.º, que a faculdade de consulta do processo de promoção e proteção pelos pais, através de mandatário (n.º 3, da disposição), face ao caráter reservado do processo (n.º 1 do preceito), excluía a confiança dos autos ao mandatário para exame por este fora do tribu- nal, no quadro da preparação do recurso. Note-se que a formulação aqui adotada desta questão se mostra conforme à ratio decidendi da decisão recorrida e à substância das alegações produzidas. Face à enunciação da recorrente – “quando interpretado no sentido de os advogados dos pais não terem a igualdade de armas do Ministério Público para exame no seu gabinete de todo o processo em período de alegações de recurso” –, expurgou-se apenas o segmento sublinhado, que, correspondendo a uma conclusão de direito, se reconduz, precisamente, a um parâmetro a ponderar nos fundamentos da presente decisão, razão pela qual não pode ser antecipadamente incorporado na norma (sem prejuízo de vir a ser apreciado). É certo que ambas as interpretações expressam de alguma forma uma construção ad hoc em vista da integração do pressuposto central legitimador do recurso junto deste Tribunal, num quadro de relativamente escassa consistência substancial das questões. Isto, porém, é uma observação já resultante de uma aprecia- ção substancial da incidência de cada uma das situações na dinâmica deste processo, que não afasta que tenham sido suscitadas – como entendemos ter sucedido – duas questões de inconstitucionalidade norma- tiva, que o tribunal a quo entendeu e apreciou como tal, as quais, por isso mesmo, não podem deixar de ser

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