TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

237 acórdão n.º 62/17 invocar as razões de facto e direito, oferecer provas, controlar a admissibilidade e a produção das provas da outra parte e pronunciar-se sobre o valor e resultado de umas e outras […]” e o “[…] direito de conheci- mento dos dados do processo (dossier) ”, ambas decorrendo do direito (complexo) a um processo equitativo. A apreciação dos referidos parâmetros obriga a “determinar, em função das circunstâncias de cada caso e nomeadamente da gravidade das medidas a tomar, se os pais puderam desempenhar no processo decisório, considerado como um todo, um papel suficientemente relevante que lhes garanta a proteção que os seus interesses requerem” (§76 do acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem proferido no caso Pontes c. Portugal, datado de 10 de abril de 2012, consultado na versão portuguesa disponível no endereço web http://hudoc.echr.coe.int/eng?i=001-119146 ). 4.1. A necessidade de notificação de prova documental, não sendo assunto tratado pelo Tribunal a propósito da LPCJP, foi-o já no âmbito do direito processual penal. Ora, não estando aqui em causa afirmar algum tipo de analogia entre os dois quadros processuais, a circunstância de ambos envolverem a possibi- lidade de proferimento de decisões ablativas de posições jurídicas jusfundamentais de forte carga pessoal dos sujeitos justifica que se dedique atenção aos argumentos então expendidos, já que algumas razões que relevaram para um poderão proceder também para o outro, em face de algum tipo de proximidade de razão – não de identidade – referida às particularidades do resultado possível deste processo – corte radical de uma relação de filiação –, quando colocado em paralelo com o tipo de resultado envolvido no processo penal. Assim, no Acórdão n.º 87/99, o Tribunal decidiu não julgar inconstitucionais as normas dos artigos 127.º, 355.º e 165.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, interpretadas no sentido de o tribunal de 1.ª instância poder formar a sua livre convicção com base em documentos que foram juntos ao processo com a acusação, tendo sido mantidos durante a instrução e tendo acompanhado a pronúncia do arguido, mas que não foram nem lidos nem explicados na audiência. Na fundamentação, apreciando a eventual violação do princípio do contraditório, considerou o Tribunal: “[…] Conclui, portanto, que “os documentos constantes do processo se consideram produzidos em audiência inde- pendentemente de nesta ser feita a respetiva leitura, desde que se trate de caso em que esta leitura não seja proibida”. Este entendimento não obsta a que, devendo as partes estar presentes na audiência, aí participem na produ- ção da prova, contribuindo para iluminar todos os aspetos relevantes para descoberta da verdade material, mas tratando-se de documentos que foram juntos com a acusação e depois se mantiveram durante a instrução e acom- panharam a pronúncia do arguido, teve este todas as possibilidades de os questionar, podendo ainda, na própria audiência, provocar a sua reapreciação individualizada para esclarecer qualquer ponto da sua defesa relativamente à qual entendesse que isso seria necessário e, assim, pedir a leitura de qualquer desses documentos.  Não é, porém, indispensável à satisfação da exigência do princípio do contraditório, quer na modalidade do princípio da oralidade quer da imediação, a leitura necessária de toda a prova documental pré-constituída e junta ao processo. Quanto a este tipo de prova, como bem refere o Ministério Público nas suas alegações, “o princípio do contraditório há de traduzir-se – como resulta da parte final do n.º 2 do artigo 517.º do Código de Processo Penal – em ter necessariamente de facultar-se às outras partes ou sujeitos do processo a impugnação quer da respetiva admissão quer da sua força probatória”. Acresce que é a audiência de julgamento no seu conjunto e os atos instrutórios que a lei determinar que a Constituição submete ao princípio do contraditório e não a prova testemunhal ou por declarações. O conteúdo essencial deste princípio está em que nenhuma prova deve ser aceite em audiência nem nenhuma decisão deve aí ser tomada pelo juiz sem que previamente tenha sido dada uma ampla e efetiva possibilidade ao sujeito processual contra o qual ela é dirigida de a discutir, de a contestar e de a valorar. Ora, no caso em apreço, o arguido teve toda a oportunidade que discutir, contestar e de desvalorizar os factos constantes dos documentos em questão; a leitura em audiência de dezenas de documentos nada acrescentaria às oportunidades de defesa do arguido. Seria, como refere o Ministério Público, “um verdadeiro “simulacro” de

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