TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

238 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL “constituição” no decurso daquele ato processual de uma prova que, afinal, já existia, de modo anterior e autónomo relativamente ao processo penal em questão”.  Não ocorre, pois, nos autos, qualquer violação quer do princípio do contraditório quer do direito de defesa do arguido. […]”. No Acórdão n.º 355/00, decidiu-se não julgar inconstitucionais as normas dos artigos 283.º, n.º 1, alínea b) , e 379.º, alínea b) , do Código de Processo Penal, na interpretação de que é possível ao tribunal, sem ter efetuado ao arguido a comunicação a que se reporta, quer o artigo 358.º, quer o artigo 359.º do mesmo diploma, dar por provado determinado facto não expressamente mencionado na acusação, mas para cuja prova, nesta peça processual, expressamente se invoca um documento existente nos autos. E, no Acórdão n.º 110/11, este Tribunal decidiu não julgar inconstitucionais as normas do n.º 1 do artigo 355.º, do n.º 2 do artigo 327.º e do n.º 2 do artigo 340.º, todos do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual o tribunal pode suportar uma decisão condenatória num documento que, embora integre os autos desde o inquérito, não foi indicado na acusação, nem tão-pouco apresentado e dis- cutido na audiência de julgamento, sendo oportuno transcrever parte da sua fundamentação: “[…] [A] lei processual penal adota uma noção ampla de documento, considerando como tal toda a declaração, sinal ou notação corporizada em escrito ou qualquer outro meio técnico nos termos da lei penal (artigo 164.º do CPP). Esta remissão integrativa para a lei penal significa que se considera documento qualquer “declaração corporizada em escrito, ou registada em disco, fita gravada ou qualquer outro meio técnico, inteligível para a generalidade das pessoas ou para um certo círculo de pessoas, que, permitindo conhecer o emitente, é idónea para provar facto juridicamente relevante, quer tal destino lhe seja dado no momento da sua emissão quer posteriormente; e bem assim o sinal materialmente feito, ou posto numa coisa para provar facto juridicamente relevante e que permite reconhecer à generalidade das pessoas ou a um certo círculo de pessoas o seu destino e a prova que dele resulta” [artigo 255.º, alínea a) , do CP]. Porém, documentos há, como aquele cuja valoração está em causa, que se limitam a conter a narrativa de atos processuais ou do inquérito. O “objeto elaborado pelo homem” em que consistem (artigo 362.º do Código Civil) visa traduzir  ou reproduzir o que ocorreu numa determinada diligência do inquérito ou do processo. Não são incorporados no processo para comprovar um facto externo, mas sim elaborados e integrando necessariamente o processo como instrumento destinado a fazer fé quanto aos termos em que se desenrolaram os atos processuais ou de inquérito. Não deixando de ser em sentido genérico documentos, em sentido material são autos (artigo 99.º do CPP). Ora, perante tais documentos, pelo menos quando a narrativa que contêm do que ocorreu em deter- minada diligência está indissoluvelmente ligada a um resultado que se destinou a preparar e que é expressamente invocado como meio de prova, o sujeito processual não pode ignorar a sua existência e aptidão probatória. A invo- cação probatória do resultado consequente é suficiente para assegurar que o arguido, patrocinado por advogado, possa defender-se do auto que documenta uma diligência que é um antecedente necessário à determinação desse resultado contra ele invocado, em termos de dispor e poder usar todos os instrumentos processuais necessários e adequados para defender a sua posição e contrariar a acusação. […]”. Do Acórdão n.º 110/11 decorre, em síntese, que a omissão de notificação de um documento constante dos autos não implica – só por si – uma afetação intolerável do direito de defesa, na sua dimensão de direito ao contraditório. Tudo dependerá, enfim, das circunstâncias em que o documento surge no processo e se articula com a decisão, podendo assumir relevância nesta ponderação, por exemplo: a natureza do documento; a sua centra- lidade ou caráter decisivo na formação da convicção do tribunal ou na construção decisória em geral; ter ou

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