TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

241 acórdão n.º 62/17 situação injustificada de desigualdade perante o Ministério Público, “[…] que pode consultar livremente o processo no tribunal e examiná-lo no seu gabinete”. Não cabe ao Tribunal Constitucional, como vimos já, tomar posição quanto à melhor interpretação da norma legal infraconstitucional, mas apenas apurar se aquela interpretação que vingou na decisão recorrida como ratio decidendi colide com alguma norma ou princípio da Lei Fundamental. Antes de centrarmos a nossa atenção nas particularidades do processo judicial de promoção e proteção, é oportuno recordar alguns dados colhidos na jurisprudência constitucional sobre a confiança do processo, tomando de empréstimo a fundamentação do Acórdão n.º 333/16, no qual se decidiu não julgar inconsti- tucional a norma constante do artigo 89.º, n.º 4, em conjugação com o artigo 86.º, n. os 1, 4 e 5, todos do Código de Processo Penal, interpretados no sentido de não determinarem a obrigatoriedade de conceder ao arguido a confiança do processo para o consultar fora do Tribunal. Ali se pode ler, designadamente, o seguinte: “[…] Sendo inegável […] que a publicidade do processo, bem como o direito de acesso e de conhecimento do pro- cesso por parte dos interessados, merecem acolhimento constitucional, estes constituem dimensões do direito a um processo equitativo, consagrado em geral no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição, ou integram as garantias de defesa do arguido em processo penal, asseguradas no artigo 32.º, n.º 1, também da Constituição. […] [No Acórdão n.º 133/99, o Tribunal Constitucional] foi chamado a pronunciar-se sobre a conformidade cons- titucional de uma interpretação normativa semelhante da norma do artigo 70.º, § 3, do Código de Processo Penal de 1929, tendo concluído pela não inconstitucionalidade de tal norma «quando interpretada no sentido de que, durante a instrução contraditória, as partes apenas podem consultar o processo quando este se encontre na secre- taria, enquanto que o Ministério Público, por não estar abrangido pelo âmbito da previsão do preceito, o pode fazer no seu gabinete». Também neste caso o recorrente, assistente nos autos, sustentou que a aludida interpretação normativa era violadora do princípio da igualdade de armas entre os diversos sujeitos processuais, na medida em que possibilita ao Ministério Público consultar o processo no seu gabinete, não se concedendo idêntica faculdade às partes, maxime , ao assistente, concluindo que tal entendimento conduz à inconstitucionalidade material da norma referida, por violação do disposto nos n. os 1 e 5 do artigo 32.º, e n.º 2 do artigo 18.º, todos da Constituição. O Tribunal, considerando que as considerações expendidas no Acórdão n.º 124/92 mantinham inteira vali- dade, concluiu que, não sendo inconstitucional a referida interpretação normativa do artigo 70.º, § 3, do Código de Processo Penal de 1929, não violando, designadamente, o artigo 32.º da Constituição, mesmo quando esteja em causa o arguido, as referidas considerações se aplicam, por maioria de razão, quando esteja em causa o assistente. […] As considerações então expendidas, relativas à intepretação de norma do Código de Processo Penal de 1929 (§ 2.º do artigo 70.º) mostram-se inteiramente relevantes no caso vertente, não se vendo motivo válido para nos afastarmos da sua doutrina. Com efeito, o problema concreto não é tanto – ou não é – o da paridade no esquema dialético constitucionalmente exigido entre a acusação e a defesa, mas sim, essencialmente, o do efetivo e concreto exercício do direito de defesa, acompanhado das garantias que lhe assistem por exigência constitucional. E, à luz da doutrina emanada dessa jurisprudência e do princípio da proporcionalidade não se tem por inconstitucional, nomeadamente por violação do artigo 32.º citado, a interpretação dada pelo acórdão recorrido à norma contida no artigo 89.º do Código de Processo Penal, na medida em que, no seu n.º 3, se nega, no decurso do prazo previsto no n.º 1 do artigo 287.º do mesmo diploma, o direito à confiança do processo para exame fora dos locais nele mencionados, por parte do advogado constituído defensor do arguido nos autos.». Conforme decorre desta jurisprudência, o Tribunal Constitucional tem reconhecido que o direito à confiança do processo para ser analisado no escritório do respetivo mandatário integra uma forma de realização do direito de defesa dos arguidos em processo penal (sendo um direito instrumental das garantias de defesa), assegurando,

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