TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

246 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Ora, no que respeita à primeira “norma”, verifica-se que o tribunal a quo não alicerçou a decisão recor- rida nos fundamentos que a recorrente identifica como objeto do recurso o que só por si deveria ter inviabili- zado o seu conhecimento. Por sua vez, a segunda questão não apresenta virtualidade de se refletir na solução do caso. Vejamos: i) O tribunal recorrido não aplicou, como fundamento da sua decisão, o critério de interpretação da norma contida no artigo 104.º da LPCJP segundo a qual o contraditório se mostra cumprido com a mera possibilidade de consulta dos autos sem necessidade de notificação prévia e pessoal dos documentos que serviram de prova aos factos da decisão que aplica uma medida de confiança com vista à futura adoção. Nem um tal critério normativo encontra expressão no preceito legal indicado. O que a propósito é referido na decisão recorrida – em resposta à alegação feita pela recorrente de que a medida de confiança não fora sujeita a contraditório durante o debate com as testemunhas –, é que a progenitora dos menores teve oportunidade de exercer o contraditório quanto aos factos e quanto à medida proposta no decurso do debate judicial nos termos definidos no referido artigo 104.º Eis o fundamento do decidido quanto a esta questão. A alusão à desnecessidade de notificação dos documentos constantes dos autos, dado o caráter reservado do processo, sem prejuízo da possibilidade da sua consulta para se inteirar do teor dos documentos juntos, com vista, designadamente, à preparação do debate, surge no Acórdão mera- mente como resposta à invocação, feita pela recorrente, da inconstitucionalidade da interpretação daquele artigo no sentido que viria a ser apresentado ao Tribunal Constitucional, apesar de não ter sido o acolhido pelo tribunal a quo. ii) No que respeita à segunda questão de constitucionalidade conhecida no Acórdão – a norma do n.º 3 do artigo 88.º da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, aprovada pela Lei n.º 147/99, de 1 de setembro, quando interpretada no sentido de os advogados dos pais não terem a faculdade de confiança e exame de todo o processo no seu gabinete em período de alegações de recurso – cum- pre assinalar, antes do mais, que ela não corresponde ao enunciado apresentado pela recorrente. O Acórdão corrigiu o enunciado apresentado no recurso, expurgando-o da menção à “igualdade de armas do Ministério Público”, por corresponder a uma conclusão de direito que se reconduzia ao parâmetro a ponderar. Ao fazer esta correção, porém, limitou o objeto do conhecimento a uma questão já definitivamente decidida no processo. Na verdade, não tendo havido recurso da decisão de indeferimento da confiança do processo no gabinete do advogado, esta é uma questão que de há muito se encontra definitivamente resolvida nos autos tornando, também neste ponto, inútil a decisão do Tribunal Constitucional. Inexiste interesse na apreciação do recurso de constitucio- nalidade quando a questão suscitada já se mostra definitivamente solucionada na ação, em conse- quência da formação de caso julgado, insuscetível de modificação na sentença impugnada perante o Tribunal Constitucional (cfr., entre outros, Acórdãos n. os 736/98 e 47/02). Refira-se, de todo o modo, que o que a recorrente pretendia ver apreciado à luz da Constituição era a diferença de tratamento verificada nos autos entre o Ministério Público e a progenitora em sede de alegações, por esta, diferentemente do primeiro, não ter tido a possibilidade de consulta dos autos no seu gabinete, pre- tendendo usar este argumento para vincar a ideia de falta de equidade do processo. Ora, sobre esta questão o tribunal a quo, limitou-se a confirmar que, em face do caráter reservado do processo, a consulta só podia ter lugar no tribunal e que tendo havido efetiva consulta e não tendo a recorrente alegado nenhum prejuízo pelo facto de ter tido de consultar o processo no tribunal, nem resultando dos autos a sua evidenciação, não havia qualquer violação do artigo 20.º da Constituição (processo equitativo).

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