TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

297 acórdão n.º 106/17 imediação e da audiência se decorrem mais de 30 dias sobre a última sessão, mas que esse princípio não sai beliscado se a interrupção entre sessões tiver lugar em cumprimento de um despacho do tribunal a quo” . 2.4.1. Inúmeros Acórdãos do Tribunal Constitucional se ocuparam das exigências inerentes à previsão constitucional do princípio da igualdade (artigo 13.º). Para o que ora importa apreciar, recorde-se que é jurisprudência estabilizada que a Constituição só proíbe o tratamento diferenciado de situações quando o mesmo se apresente como arbitrário, sem fundamento material, havendo que precisar o sentido da igual­ dade jurídica. Pode, assim, ler-se no Acórdão n.º 362/16, seguindo o curso de inúmeras decisões anteriores concordantes: “[…] Numa perspetiva de igualdade material ou substantiva – aquela que subjaz ao artigo 13.º, n.º 1, da Constituição e que se traduz na igualdade através da lei –, a igualdade jurídica corresponde a um conceito relativo e valorativo assente numa comparação de situações: estas, na medida em que sejam consideradas iguais, devem ser tratadas igualmente; e, na medida em que sejam desiguais, devem ser tratadas desigualmente, segundo a medida da desigualdade. Tal implica a determinação prévia da igualdade ou desigualdade das situações em causa, porquanto no plano da realidade factual não existem situações absolutamente iguais. Para tanto, é necessário comparar situações em função de um certo ponto de vista. Por isso, a comparação indispensável ao juízo de igualdade exige pelo menos três elementos: duas situações ou objetos que se comparam em função de um aspeto que se destaca do todo e que serve de termo de comparação ( tertium comparationis ). Este termo – o «terceiro (elemento) da comparação» – corresponde à qualidade ou caracte­ rística que é comum às situações ou objetos a comparar; é o pressuposto da respetiva comparabilidade. Assim, o juízo de igualdade significa fazer sobressair ou destacar elementos comuns a dois ou mais objetos diferentes, de modo a permitir a sua integração num conjunto ou conceito comum ( genus proximum ). Porém, a Constituição não proíbe todo e qualquer tratamento diferenciado. Proíbe, isso sim, as discriminações negativas atentatórias da (igual) dignidade da pessoa humana e as diferenças de tratamento sem uma qualquer razão justificativa e, como tal, arbitrárias. […] Por outro lado, não é função do princípio da igualdade garantir que todas as escolhas do legislador sejam racionais e coerentes ou correspondem à melhor solução. Nesse particular, justifica-se recordar a jurisprudência constitucional firmada no Acórdão n.º 546/11: «[O] n.º 1 do artigo 13.º da CRP, ao submeter os atos do poder legislativo à observância do princípio da igualdade, pode implicar a proibição de sistemas legais internamente incongruentes, porque integrantes de soluções normativas entre si desarmónicas ou incoerentes. Ponto é, no entanto – e veja-se, por exemplo, o Acórdão n.º 232/03 –, que o caráter incongruente das escolhas do legislador se repercuta na conformação desigual de certas situações jurídico-subjetivas, sem que para a medida de desigualdade seja achada uma certa e determinada razão. É que não cabe ao juiz constitucional garantir que as leis se mostrem, pelo seu conteúdo, ‘racionais’. O que lhe cabe é apenas impedir que elas estabeleçam regimes desrazoáveis, isto é, disciplinas jurídi­ cas que diferenciem pessoas e situações que mereçam tratamento igual ou, inversamente, que igualizem pessoas e situações que mereçam tratamento diferente. Só quando for negativo o teste do ‘merecimento’ – isto é, só quando se concluir que a diferença, ou a igualização, entre pessoas e situações que o regime legal estabeleceu não é justificada por um qualquer motivo que se afigure compreensível face à ratio que o referido regime, em conformidade com os valores constitucionais, pretendeu prosseguir – é que pode o juiz constitucional censurar, por desrazoabilidade, as escolhas do legislador.» […]”. 2.4.2. Não é difícil detetar, neste caso, o enviesamento argumentativo, que procura fazer uso do princí­ pio da igualdade para atingir a interpretação pretendida como a única possível.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=