TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

322 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL O que devemos concluir, em suma, perante as exigências constitucionais de que seja assegurado um processo equitativo, é que a norma segundo a qual a nulidade decorrente da falta ou deficiência da docu­ mentação da prova deve ser arguida no prazo de dez dias, a contar da data da sessão da audiência em que tiver ocorrido a omissão da documentação ou a deficiente documentação das declarações orais, se contém na margem de liberdade de conformação do legislador, por não impor aos sujeitos processuais – muito particu­ larmente ao assistente – uma restrição arbitrária, excessiva ou desproporcionada. De resto, ainda que elevássemos o padrão de proteção do assistente em processo penal ao nível da pro­ teção do arguido, sempre cumpriria indagar se a imposição daquele ónus implicaria um condicionamento inadmissível e injustificável das respetivas garantias, o que continuaria a merecer resposta negativa, pelas razões já explicitadas (vide, a este propósito, o Acórdão n.º 208/03, designadamente o excerto transcrito no item 3.1. supra ). 7. O recorrente não explicita, nas suas alegações, de que modo a interpretação normativa em causa poderá violar o disposto nos artigos 13.º, 22.º, 202.º, 203.º, 204.º e 205.º, n.º 3, da Constituição, nem o Tribunal consegue reconstituir qualquer ligação entre a questão suscitada e uma violação daquelas normas, cuja invocação é, manifestamente, descabida. De todo o modo, sempre se dirá que a (des)igualdade nunca se poderia aferir entre o assistente e “os tribunais”, mas apenas entre aquele e outros sujeitos processuais. Ora, a regra em causa, aplicável ao arguido, ao assistente e ao Ministério Público, não estabelece qualquer distinção em função do sujeito que invoca a nulidade, a todos se aplicando de igual modo. Serve todo o exposto, em suma, para concluir pela improcedência do recurso. 8. Sumário elaborado pelo relator: I – Nos termos do artigo 32.º, n.º 1, da CRP, o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso. Esta norma refere-se à posição jurídico-processual do arguido, e não à do ofendido/assistente. A posição deste último enquadra-se na previsão do n.º 7 do artigo 32.º da CRP – “[o] ofendido tem o direito de intervir no processo, nos termos da lei” –, sendo por esta via que se alcança a garantia do direito deste a recorrer das decisões que o prejudiquem; II – Neste quadro, observando a posição de cada um dos sujeitos, pode-se afirmar que “[…] as garan­ tias constitucionais da posição processual do assistente não hão de ir mais longe do que as do arguido […]” (Acórdão n.º 176/02), permitindo a construção de argumentos de maioria de razão face à posição deste, no sentido de a Constituição não conferir ao assistente em processo penal uma proteção mais intensa daquela que prevê para o arguido; III – A norma resultante da conjugação dos artigos 363.º, 364.º, n.º 1, e 105.º, n.º 1, do CPP, na interpretação (obtida por referência ao acórdão do STJ de uniformização de jurisprudência n.º 13/2014) segundo a qual a nulidade prevista no artigo 363.º do CPP deve ser arguida perante o tribunal de primeira instância, em requerimento autónomo, no prazo geral de 10 dias a contar da data da sessão da audiência em que tiver ocorrido a omissão da documentação ou a deficiente documentação das declarações orais, sob pena de dever considerar-se sanada não é arbitrária, ser­ vindo interesses de economia processual, eficiência e, em geral, de racionalidade na utilização dos recursos dos tribunais. IV – A mesma norma não estabelece um ónus excessivo ou desproporcionado, exigindo um grau de disciplina e cuidado adequado à relevância do ato cuja regularidade se visa assegurar, não impe­ dindo nem condicionando substancialmente o direito ao recurso em matéria de facto ou qualquer outro de que o assistente seja titular para afirmação dos seus interesses no processo; V – Consequentemente, o sentido interpretativo indicado em III não é inconstitucional.

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