TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

336 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL comunitário, sobretudo no âmbito do recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) n.º 1 do artigo 70.º da LTC. Não pode ter esse efeito porque o Tribunal Constitucional vem afastando qualificar a incom­ patibilidade do direito interno com o direito comunitário como uma questão de “inconstitucionalidade” que lhe caiba apreciar. Independentemente do reconhecimento constitucional do primado do direito da UE – n.º 4 do artigo 8.º da CRP – a desconformidade de norma legislativa interna com as normas comunitárias, de direito origi­ nário ou derivado, não constitui um problema de constitucionalidade que se integre na esfera cognitiva deste Tribunal (Acórdãos n. os 326/98, 621/98, 164/01, 466/03, 598/04, 717/04 e 569/16). Apenas nas situações expressamente previstas nos artigos 70.º, n.º 1, alínea i), e 71.º, n.º 2, da LTC, o Tribunal Constitucional tem competência para fiscalizar a compatibilidade do direito interno com o direito da UE (Acórdão n.º 371/91). Assim sendo, não se justifica, no presente caso, o reenvio prejudicial. 6. Inconstitucionalidade orgânica do n.º 3 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 314/2000, de 2 de dezembro. Os recorrentes alegam que o n.º 3 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 314/2000, de 2 de dezembro, padece de inconstitucionalidade orgânica, uma vez que a Lei n.º 18/2000, de 10 de agosto, não autorizou o Governo a atribuir, genérica e automaticamente, caráter urgente a todas as expropriações do Programa Polis , mas apenas a “aprovar regras que tornassem céleres e eficazes as expropriações” realizadas no âmbito desse programa; a atribuição, através do Decreto-Lei n.º 314/2000, de 2 de dezembro, de caráter urgente a todas as expropriações não corresponde a “criar regras”, mas antes à previsão de um instituto jurídico que contém ele próprio regras, podendo essas regras ser objeto de alteração para tornar mais célere e eficaz a expropriação; como aquela Lei assume que nem todas as expropriações têm caráter urgente e que o caráter urgente tem que ser atribuído, casuística, justificada e fundadamente, pela entidade expropriante, o decreto-lei autorizado, ao classificar ope legis e de forma automática as expropriações do Programa Polis como sendo todas urgentes, extravasa os limites da lei de autorização. É sabido que a lei de autorização legislativa está condicionada a definir o objeto, o sentido, a extensão e a duração da autorização (artigo 165.º, n.º 2, da CRP) e que o decreto-lei autorizado que não respeite essa lei – mesmo não contendo matéria inovatória – é inconstitucional. O objeto consiste na enunciação da maté­ ria sobre a qual a autorização vai incidir, podendo ser feita por mera remissão ou de forma indireta ou até implícita, quer por referência a atos legislativos preexistentes, quer por decorrência dos princípios e critérios diretivos aplicados a uma matéria genericamente enunciada ou a matérias conexas; o sentido da autorização legislativa está associado a uma exigência de princípios e critérios orientadores da ação do Governo e deverá permitir compreender a finalidade da concessão dos poderes delegados na perspetiva dinâmica da intenção das transformações a introduzir na ordem jurídica vigente; e a extensão da autorização refere-se a aspetos da disciplina jurídica daquelas matérias que vão ser objeto de modificação (Acórdãos n. os  414/96 e 125/15).  De modo que, tratando-se de matéria de competência legislativa reservada da Assembleia da República, só é lícito ao Governo legislar sobre ela nos precisos termos da autorização. A ultrapassagem dos limites da autorização, como acontece quando se legisle sobre matéria diferente ou para além da autorizada ou em sen­ tido divergente do autorizado, constitui motivo de inconstitucionalidade do decreto-lei autorizado. No caso vertente, as dúvidas de constitucionalidade suscitadas pelos recorrentes reportam-se mais pre­ cisamente ao sentido e extensão da autorização legislativa. Está em causa a amplitude da norma da alínea f ) do artigo 2.º da Lei n.º 18/2000, que autoriza o Governo a: «Estabelecer regras específicas para tornar célere e eficaz o processo das expropriações necessárias à realização das intervenções aprovadas e a aprovar no âmbito do Programa Polis, bem como regras específicas relativas ao reordenamento urbano daí resultante e à reinstalação e funcionamento de atividades localizadas nas zonas de inter­ venção respetivas, designadamente no que respeita à posse administrativa dos bens a expropriar cuja declaração de

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