TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

342 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL modo, reportando-se à expropriação acessória ao plano urbanístico, Alves Correia considera que a tentativa de obter por meios privados os bens necessários à realização do interesse pública é uma exigência do princípio da necessidade, na sua dimensão instrumental, o que «significa que a expropriação é encarada pelo nosso ordenamento jurídico com a ultima ratio ou, por outras palavras, a expropriação tem sempre um caráter subsidiário em relação aos instrumentos jurídico-privados de aquisição de bens» ( O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade, Almedina, p. 487). No procedimento expropriativo normal, a intervenção dos interessados ocorre em momento anterior à declaração de utilidade pública. A tentativa de aquisição por via do direito privado inicia-se com a notifica­ ção da resolução de requerer a declaração de utilidade pública, que deve ser acompanhada com a proposta de aquisição por via do direito privado (artigo 11.º, n.º 2, do CE); os interessados podem proceder à avaliação do imóvel através de um perito da sua escolha (artigo 11.º, n.º 5); a recusa ou falta de resposta no prazo fixado ou a falta de interesse na contraproposta apresentada confere, de imediato, à entidade expropriante a faculdade de apresentar um requerimento para a declaração de utilidade pública (artigo 11.º, n.º 6); o requerimento de utilidade pública deve ser instruído com todos os elementos relativos à fase da tentativa de aquisição por via do direito privado [artigo 12.º, alínea b), do n.º 1]. Independentemente do modo como se possa qualificar o procedimento de aquisição por via do direito privado – pré-procedimento expropriativo ou fase do procedimento expropriativo – ou da natureza da rela­ ção jurídica que o integra – privatística ou administrativa – esse procedimento integra um conjunto de atos e formalidades que dão corpo a uma dialética negocial que se pode prolongar por muito tempo. Com efeito, avaliação do perito do expropriante, a notificação aos interessados da resolução de expropriar e da proposta de aquisição, a avaliação do perito do expropriado, a contraproposta, a notificação da falta de interesse na contraproposta, etc. são atos e formalidades da fase negocial cuja morosidade pode comprometer a emissão, em tempo devido, da declaração de utilidade pública. Ora, a lei dispensa a realização dessa fase negocial quando o fim de utilidade pública tem natureza urgente: a entidade interessada na expropriação notifica a resolução de expropriar aos interessados e remete à entidade competente o requerimento de utilidade pública (artigos 11.º, n.º 1, e 12.º, n.º 1, do CE). O que justifica a supressão dessa fase preliminar só pode ser a necessidade de satisfazer com rapidez o fim de utilidade pública declarado. Por razões de tempo, a lei prescinde da fase da tentativa de aquisição pelo direito privado, ganhando-se em tempo o que se perde em forma. Como dizem Feitas do Amaral e Maria Glória Garcia, cria-se «uma normatividade especial relativamente à normatividade geral, uma normatividade mar­ cada pela simplificação de procedimentos ou pela preterição de regras gerais ( ob. cit. p. 490). A preterição da tentativa prévia de aquisição por via do direito privado nas expropriações urgentes não contraria o princípio da proporcionalidade, na vertente de necessidade. Se a existência dessa fase assenta na dimensão instrumental do princípio da necessidade (ou da indispensabilidade), que só consente a expropria­ ção após esgotada a possibilidade de aquisição por via do direito privado, a justificação para a sua preterição também se encontra no princípio da proporcionalidade, mas agora na sua dimensão temporal. Como refere Alves Correia «(É) indispensável que o interesse público reclame a expropriação no momento concreto em que é emanado o ato de declaração de utilidade pública» ( ob. cit. p. 489). Se esse momento reclama urgência na satisfação da utilidade pública expropriativa, torna-se indispensável utilizar um procedimento simplifi­ cado (urgente) que permita realizar rapidamente aquela finalidade. Ora, não parece evidente que a preterição da tentativa prévia de aquisição por via do direito privado não seja uma medida indispensável à realização urgente da expropriação. Para desformalizar o procedimento por motivos de urgência não é manifestamente desadequado ou desnecessário prescindir da fase preliminar cuja duração pode pôr em causa a satisfação imediata utilidade pública expropriativa. As garantias materiais e procedimentais dos expropriados não são excessivamente afetadas com a prete­ rição da fase inicial de negociação através de meios contratuais jus-privatísticos. Estando verificados os pres­ supostos da utilidade pública expropriativa, muitas vezes expressos em planos de ordenamento do território, a liberdade que aquela fase proporciona aos interessados já está muito condicionada pela ameaça do exercício

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