TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

348 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL adoção de um procedimento expropriativo que o realize num tempo preciso e numa forma simplificada de atuação. Por isso mesmo, a urgência surge como elemento determinante e constitutivo da utilidade pública prevista no n.º 1 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 314/2000, justificando a adopção do procedimento jurí­ dico especial referido no n.º 3 do mesmo preceito. A norma do n.º 3 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 314/2000 remete para o procedimento urgente previsto no Código das Expropriações, que se distingue do regime-regra pelas seguintes especialidades: (i) é dispensada a tentativa de aquisição por via do direito privado (artigo 15.º, n.º 1); (ii) o requerimento do pedido de declaração de utilidade pública tem que ser instruído com a programação dos trabalhos elabo­ rada pela entidade expropriante [artigo 12.º, alínea d) , do n.º 1]; (iii) a atribuição do caráter de urgência à expropriação “para obras de interesse público” pode ser atribuído no próprio ato declarativo de utilidade pública (artigo 15.º, n.º 1); (iv) a declaração de urgência deve ser sempre fundamentada (artigo 15.º, n.º 2); (v) confere de imediato à entidade expropriante a posse administrativa dos bens a expropriar (artigo 15.º, n.º 2); (vi) e dispensa o depósito prévio à investidura da posse da quantia determinada com os encargos da expropriação, devendo o mesmo ser efetuado no prazo de 10 dias após a data dessa investidura (artigo 20.º, n.º 6); (vii) a atribuição do caráter urgente caduca se as obras não tiverem início no prazo fixado no programa de trabalhos, salvo ocorrendo motivo justificado, sem que a caducidade obste à ulterior autorização da posse administrativa (artigo 15.º, n. os  3, 4 e 5). A lei não fornece uma definição de «urgência», nem especifica as condições de recurso ao procedi­ mento expropriativo urgente, limitando-se a prescrever, na parte final do n.º 1 do artigo 15.º, que o caráter de urgência pode ser atribuído às expropriações para «obras de interesse público». Independentemente da questão de saber se este conceito de «interesse público» tem o mesmo sentido que o conceito de «utilidade pública», certo é que a imprecisão dos conceitos confere às entidades expropriantes uma ampla margem de livre de avaliação e valoração das situações que, por motivo de urgência temporal, exigem uma expropriação à margem do procedimento comum. Os conceitos indeterminados «urgência» e «interesse público» deixam às entidades expropriantes margem de liberdade para aferir caso a caso da necessidade de se recorrer à expro­ priação urgente. Como escreve Carla Amado Gomes, «estabelecer os pressupostos deste conceito (urgência) faz parte da margem de livre apreciação administrativa, numa operação de qualificação jurídica em que é determinante o princípio da proporcionalidade, na sua vertente de necessidade» ( Contributo para o Estudo das Operações Materiais da Administração Pública e do Seu Controlo Jurisdicional, Coimbra Editora, p. 183). Mas a possibilidade que Administração tem de concretizar as situações ou as causas que legitimam o procedimento expropriativo urgente não significa que só ela tenha o poder de declarar a urgência. O ato declarativo da urgência expropriante tanto pode estar contido numa lei – urgência legislativa – como derivar de fonte jus-administrativa – urgência administrativa. Se bem que as entidades expropriantes administrativas possam estar melhor colocadas para ajuizar da incapacidade de se alcançar a utilidade pública expropriativa através do procedimento normal, em certas situações tal reconhecimento pode ser feito diretamente pelo legislador. O próprio CE prevê essa possibilidade nos n. os 1 e 2 do artigo 14.º conjugados com o n.º 1 do artigo 15.º: se a urgência da expropriação deve constar do próprio ato declarativo de utilidade pública e se este ato pode resultar «genericamente da lei», a declaração de urgência terá que revestir nesse caso a forma de lei. Aliás, como dá conta Carla Vicente, em determinados momentos da história evolutiva da expropriação no nosso ordenamento jurídico «a declaração genérica da urgência, por força da lei, constituiu a regra e não a exceção» (cfr. A urgência na Expropriação. Algumas questões, 2.ª edição AAFDL, Lisboa, p. 104). A autora menciona mesmo vários exemplos recentes de urgência ope legis nas expropriações, designadamente as que tiveram por objeto os imóveis necessários à realização da EXPO 98 (Decreto-Lei n.º 354/93, de 9 de outubro), da nova travessia sobre o rio Tejo (Decreto-Lei n.º 168/94, de 15 de junho), do empreendimento do Alqueva e insta­ lação da Aldeia das Luz (Decreto-Lei n.º 21-A/98, de 6 de fevereiro) e as decorrentes da declaração de áreas críticas de recuperação e de reconversão urbanística (Decreto-Lei n.º 794/76, de 6 de novembro).

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=