TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

374 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Ora, no caso dos autos, face ao circunstancialismo específico ocorrido – acção de muito elevado valor mas que veio a terminar logo após a citação (sem sequer ter chegado a existir contestação por parte dos RR.) por desistência do pedido e consequente sentença homologatória, afigura-se-nos ser de repristinar o regime legal previsto na ante­ rior versão do Regulamento das Custas Processuais (DL n.º 34/2008 de 26.02) e, em especial, o regime em que, por um lado, ali se consagrava para uma acção deste valor ( € 30 000 000) uma taxa de justiça inicial mínima de 20 UC’s – art. 6.º, n.º 1 e tabela I anexa ao citado DL n.º 34/2008 – e, por outro, se previa também a possibilidade de o juiz dispensar o pagamento do valor remanescente ( i. e. o valor para além daquela taxa de justiça mínima de 20 UC’s), sempre que não optasse por fixar um valor tributário da causa acima daquele valor de 20 UC’s. Com efeito, um tal regime permite, por um lado, adequar o valor das custas ao valor da própria causa (ele­ vando o valor da taxa de justiça inicialmente paga para um mínimo de 20 UC’s), mas, sobretudo, adequar, por intervenção do juiz do processo – através do mecanismo de fixação, a final, do valor tributário da causa para efeitos de custas –, a taxa de justiça devida ao concreto processado, à sua complexidade, à sua duração, enfim ao serviço efectivamente prestado, em consonância com o normativo previsto no art. 6.º, n.º 1 do citado Regulamento. (…)» 7.3. Em suma, o objeto do presente recurso afigura-se ser «a norma que se extrai da conjugação do disposto nos artigos 6.º, 11.º, 14.º e 22.º do Regulamento das Custas Processuais, na redação do Decreto-Lei n.º 52/2011, de 13 de abril, na parte em que dela resulta que as custas devidas pelo autor, no montante global de € 327 756,60, autor, esse, que desistiu do pedido logo após o despacho que ordenou as citações, são determinadas exclusivamente em função do valor da ação, sem o estabelecimento de qualquer limite máximo, e na medida em que não se permite que o tribunal reduza o montante da taxa de justiça devida no caso concreto, tendo em conta, designadamente, a natureza e complexidade do processo e o carácter manifestamente desproporcionado desse montante» – tal como identificada na resposta ao convite ao aper­ feiçoamento do requerimento de interposição de recurso com a precisão de que a referida «norma» deve considerar-se igualmente extraída da Tabela I Anexa ao RCP, por força da remissão constante do referido artigo 6.º do mesmo Regulamento. B) Do mérito 8. Assim fixado o objeto do recurso quanto ao enunciado da «norma» ou interpretação normativa desa­ plicada pela decisão ora recorrida, cumpre apreciar a questão de constitucionalidade sindicada junto deste Tribunal. Entendeu o juiz que proferiu o despacho ora recorrido que tal norma é inconstitucional, desde logo por violação do princípio constitucional da proporcionalidade ínsito no princípio do Estado de direito consa­ grado no artigo 2.º da Constituição. Vejamos, pois. 9. A questão de constitucionalidade das normas do Regulamento das Custas Processuais em causa e sua interpretação não deixa de convocar, desde logo, a norma do artigo 20.º, n.º 1, da Constituição, que estabe­ lece uma garantia fundamental de acesso aos tribunais, enquanto concretização do princípio do Estado de direito. A compreensão do sentido e alcance desse preceito constitucional haverá de ter em conta a dupla dimen­ são da garantia do acesso à justiça – a dimensão de defesa e a dimensão de prestação (Acórdão n.º 467/91 – disponível, bem como os demais que se citam, em www.tribunalconstitucional.pt ) . Assim, decorre da jurisprudência constitucional que a Constituição não consagra, no artigo 20.º, um direito de acesso ao direito e aos tribunais gratuito ou sequer tendencialmente gratuito, sendo constitucio­ nalmente justificado o estabelecimento da exigência de uma contrapartida pela prestação dos serviços de administração da justiça (cfr. Acórdãos n. os 307/90, 214/00 e 422/00).

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