TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

375 acórdão n.º 155/17 Aliás, é justamente por assumir a não-gratuitidade do sistema de justiça que a Constituição impõe ao legislador o dever de assegurar, designadamente através do instituto do apoio judiciário, que as pessoas eco­ nomicamente carenciadas não fiquem privadas da utilização do sistema em ordem a tutelar os seus direitos e interesses. Mas tal não significa, diz-nos ainda a jurisprudência constitucional, que, ressalvadas as situações de insu­ ficiência de meios económicos, o legislador seja totalmente livre na fixação do montante das custas a suportar por quem exerce o seu direito de aceder à justiça e aos tribunais. É que a pluridimensionalidade da garantia fundamental de acesso à justiça e aos tribunais deve ser com­ preendida na sua unidade. Como se escreveu no Acórdão n.º 352/91 «[…] o nosso ordenamento jurídico concebe o sistema de apoio judiciário como algo que apenas visa garantir o acesso aos tribunais aos econo­ micamente carenciados, e não como um instrumento ao serviço também das pessoas de médios rendimentos (salvo, naturalmente, se estas houverem de intervir em ações de muito elevado valor). Na fixação das custas judiciais, há-de, pois, o legislador ter sempre na devida conta o nível geral dos rendimentos dos cidadãos de modo a não tornar incomportável para o comum das pessoas o custeio de uma demanda judicial, pois se tal suceder, se o acesso aos tribunais se tornar insuportável ou especialmente gravoso, violar-se-á o direito em causa». A mesma ideia é reafirmada no Acórdão n.º 495/96, em que o Tribunal afirmou que «[o] instituto do apoio judiciário não é, pois, um instrumento generalizado, ou pressuposto primário de acesso ao direito: é, antes, um remédio, uma solução a utilizar, de forma excecional, apenas pelos cidadãos economicamente carenciados ou desfavorecidos, e não de forma indiscriminada pela globalidade dos cidadãos. Isto implica, necessariamente, que também o sistema das custas judiciais tenha que ser um sistema proporcional e justo, que não torne insuportável ou inacessível para a generalidade das pessoas o acesso aos tribunais». É por isso que, não obstante o Tribunal Constitucional afirmar que o legislador dispõe de uma larga margem de liberdade de conformação em matéria de definição do montante da taxa de justiça (Acórdãos n. os  352/91, 70/98, 521/99 e 708/05), não deixar de esclarecer, contudo, «que essa liberdade não implica que as normas definidoras dos critérios de cálculo sejam imunes a um controlo de constitucionalidade, quer no que toca à sua aferição segundo regras de proporcionalidade, decorrentes do princípio do Estado de direito (artigo 2.º da Constituição), quer no que respeita à sua apreciação à luz da tutela constitucional do direito de acesso à justiça (artigo 20.º da Constituição); em qualquer dos casos, sob a cominação de inconstitucio­ nalidade material» (cfr. Acórdãos n. os 352/91, 467/91, 1182/96 ou 247/99). E o Tribunal proferiu, mesmo, alguns julgamentos de inconstitucionalidade por violação combinada de ambos os princípios (por exemplo, nos Acórdãos n. os 1182/96 e 521/99). A esse propósito importa, no entanto, assinalar que o Tribunal Constitucional tem entendido que a Constituição não exige que a taxa de justiça corresponda ao custo do serviço de administração da justiça (Acórdão n.º 67/90), não tendo de verificar-se uma rigorosa equivalência económica entre o valor do serviço e o montante da quantia a prestar pelo utente desse serviço (Acórdão n.º 349/02). O que é exigível é que, de um ponto de vista jurídico, o pagamento do tributo tenha a sua causa e justificação – material, e não meramente formal –, na perceção de um dado serviço (Acórdão n.º 349/02). Para que se possa considerar existir uma clara desproporção que afeta o carácter sinalagmático de um tributo não se pode atender apenas ao carácter fortemente excessivo da quantia a pagar relativamente ao custo do serviço (Acórdãos n. os 640/95 e 1140/96); ela há-de igualmente ser aferida em função de outros fatores, designadamente da utilidade do serviço para quem deve pagar o tributo (cfr. Acórdãos n. os 1140/96, 115/02 e 349/02). Seguindo os critérios resultantes desta sua jurisprudência, o Tribunal Constitucional, num momento inicial, foi prudente na apreciação dos excessos indicadores de uma falta de proporcionalidade enquanto desvirtuantes da correspetividade (Acórdãos n. os 410/00, 115/02 e 349/02). Posteriormente, a partir do Acórdão n.º 227/07, o Tribunal passou a efetuar um escrutínio mais intenso, fundando-se naquilo que teria sido a orientação das declarações de voto apostas nos Acórdãos n. os 115/02 e 349/02 (no essencial, a divergência manifestada nestas declarações assenta no argumento segundo o qual teria havido uma ampliação do conceito constitucional de taxa: deixar de se referir como critério a relação

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